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Comunicação Política

Comunicação Política

12
Mai13

Introdução

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Política é comunicação.
Toda e qualquer acção política passa pela comunicação.

Construir um movimento doutrinário, edificar uma estrutura assente em bases ideológicas ou pragmáticas, alargar essa estrutura gerando simpatias, crenças, expectativas…governar e fazer oposição. Tudo isto passa pela comunicação. “Para chegar ao poder, assim como para o exercer ou prestar contas ao cidadão, a política é comunicação.” (1)

Seja qual for o sistema político e a organização do Estado. A própria legitimação do sistema assenta nesta capacidade de comunicação - «as acções para gerar e manter a crença social da validade das instituições são em grande medida uma tarefa que se dá à propaganda. Nela se atribui a função de difundir os princípios e os valores que fundamentam o exercício ideológico, consolidar a legitimação do sistema.» (2)


Esta é uma das características mais salientes da Democracia porque está directamente relacionada com um dos elementos essenciais do sistema: o voto. Votar é escolher. Para haver uma escolha tem de existir informação sobre as candidaturas.

Quanto mais informação, quanto melhor o conhecimento acerca da governação, dos programas eleitorais e do estado do país, mais se afirma a Democracia. Apesar de, aparentemente, provocar resultados contraditórios: em Portugal, por exemplo, o grupo de pessoas com maior nível de instrução é o mais crítico e o que mais rapidamente assume uma postura de desconfiança em relação à governação do país.
Segundo o sociólogo Pedro Magalhães, a capacidade de discernimento deste tipo de eleitor perante o não cumprimento das promessas por parte do eleito propicia este sentimento negativo.

Os assuntos relativos a uma comunidade local ou a toda a sociedade deixaram de ser exclusivo de uma elite. Passaram para a «esfera pública» onde cada cidadão pode exercer os seus direitos, individualmente ou inserido numa organização.
O próprio debate dos temas colectivos é aberto e tende a ser o mais abrangente possível. Uma multiplicidade de direitos (e novos direitos) – cidadania, organização, opinião, diferença…. – são indutores da necessidade de afirmação, de fazer valer os respectivos pontos de vista para influenciar a tomada de decisão.
Este processo passa necessariamente pela troca de informação, pela procura de se ser notícia, de fazer parte da agenda dos media. Todos os suportes são válidos - imprensa, rádio, televisão, internet, comunicação directa ou por líderes de opinião....Esta necessidade não se resume às organizações políticas. Hoje em dia a estruturação do poder passa por outras entidades, como sindicatos e grupos de pressão. É um fluxo que se estabelece em rede, onde os núcleos centrais são os eleitos, os eleitores e grupos de pressão.

Independentemente destes efeitos, há uma necessidade permanente de os regimes democráticos serem sistemas abertos, com um fluxo significativo de informação.

O trabalho desses profissionais é, em síntese, recolher e interpretar informação e comunicar da forma mais positiva possível as decisões que são tomadas.

O objectivo principal passa por dois planos:
- dar a conhecer, de forma positiva, a organização e/ou a liderança;
- influenciar o cidadão em determinado sentido.

A primeira fase, «dar a conhecer», tem em vista a notoriedade: é a difusão do nome do líder, do candidato, da plataforma política ou das acções que estão a ser desenvolvidas por entidades, como por exemplo, governos, autarquias e partidos políticos.
Trata-se essencialmente de construir uma imagem, uma mais-valia em função dos outros concorrentes ou das propostas que estão em discussão.

“Fizemos uma sondagem que revelou isso mesmo, há uma percentagem assustadora de portugueses que não sabem quem é o Dr. Durão Barroso” (…) Por isso, o primeiro “outdoor” de campanha que o PSD vai pôr na rua tem a cara do líder e a pergunta “Já tem o Portugal que quer?”, sem qualquer menção ao partido, apenas o símbolo gráfico. “o que queremos, nesta fase, é dizer que ele é o líder, apenas isto” (3)
A segunda fase visa alcançar o apoio dos cidadãos. O objectivo é convencer – o verbo diz tudo - através da persuasão, de uma mensagem fortemente apelativa e frequentemente emocional. “É um processo comunicativo cuja finalidade ou objectivo é a influência. Uma mensagem persuasiva comporta-se segundo a conduta expressa pelo emissor para que seja adoptada voluntariamente pelo receptor”(4).

Se a comunicação política não atinge a audiência desejada, a mensagem que se pretendeu transmitir não tem qualquer relevância e, por vezes, até tem um efeito negativo. O mesmo se pode afirmar quando atinge a audiência pretendida mas a mensagem não é adequada.

Um outro elemento a ter em conta é que nem sempre o aumento da notoriedade implica uma melhor popularidade. No exemplo atrás citado, do outdoor e a volta a Portugal de Durão Barroso, o resultado não foi o melhor para o então líder do PSD. Segundo sondagens divulgadas pelo DN/TSF/Marktest (30-07-99), Semanário/Eurotest (30-07-99) e Expresso/Euroexpansão (31-07-99), com o final da volta a Portugal, Durão Barroso aumentou a notoriedade mas prejudicou a popularidade, devido essencialmente ao aumento de opiniões negativas.

Quer numa, quer noutra fase - que se podem e devem integrar – são definidos os objectivos a alcançar, o eleitorado preferencial a atingir, qual o tempo necessário para concretizar as iniciativas, a estratégia a seguir e as melhores formas para desenvolver essa estratégia.

Em todas estas fases há sempre um princípio a seguir: a comunicação é lançada por antecipação, antes que seja por arrastamento. Por outras palavras, a própria organização política não perde tempo na definição e desenvolvimento da sua imagem. Se não for assim, os adversários encarregam-se de construir essa imagem e, seguramente, não será muito boa.

Também pode ser a comunicação social a estabelecer essa imagem, privando, logo de início, a organização de controlar os mecanismos de produção dessa mesma imagens.

Um exemplo de antecipação que teve um efeito positivo para o autor da iniciativa: dias antes de tomar posse como ministro, Morais Sarmento deu uma entrevista num canal de TV onde confessou ter um passado toxicodependente. O facto de ter feito esta revelação, sem estar sujeito a qualquer pressão, permitiu-lhe receber rasgados elogios e inibiu os políticos adversários de insinuar este problema.

«Nuno Morais Sarmento mostrou muita coragem e personalidade na entrevista que concedeu a Maria João Avillez na SIC Notícias, ao revelar que já foi dependente de drogas duras e ao contar o seu difícil processo de recuperação e os apoios que teve.(…) Nuno Morais Sarmento vai ter tempo para mostrar se será ou não um bom ministro. Para já, mostrou carácter. E a coragem que a muitos falta.» Duarte Moral, DN; 13 de Novembro de 2002.

Por outro lado, esta antecipação evitou a possibilidade de o caso surgir, mais tarde, na forma de manchete de um jornal, apresentado como um grande escândalo.
«Para evitar uma das principais fontes de bons boatos, os estudiosos recomendam que você não inicie a campanha sem eliminar o background noise, isto é, o “ruído de fundo” na sua vida passada. Se você tem algo na sua trajectória que pode ser utilizado como munição pelos seus adversários, a melhor maneira de desarmá-los é contar logo. Assim, a “terrível denúncia” que eles iam fazer não existe mais.» (5)

Agora, um exemplo de sentido contrário. Dos efeitos negativos devido a um processo de comunicação que falhou por ser tardio na transmissão da mensagem principal: a campanha do “SIM” à regionalização no referendo realizado em 1998. «Ninguém explicou convenientemente os benefícios que a regionalização traria. Quando se tentou esclarecer a população já era tarde e já havia muito ruído por parte de outros partidos» - Margarida Ruas dos Santos in Diário Económico de 10/11/1998.

Um outo dado relevante é que, por melhor que seja a política de comunicação, ela não resolve tudo.
Santana LopesNas legislativas de 2005, Einhart da Paz foi o responsável pela campanha de Santana Lopes que teve um resultado eleitoral negativo: “«a campanha não surtiu efeito mas não foi errada», conclui Einhart, que se recusa a atirar as culpas para Santana (…) lembrando que «o papel do ‘marketing’ não é preponderante». Subjacente parece estar a certeza de que este era, à partida, um caso perdido”. – Expresso 26/02/05.

Elihu Katz, investigador norte-americano e antigo responsável da televisão pública de Israel, vai mesmo mais longe e assegura que «a realidade tem demonstrado que os milhões de dólares gastos em campanhas políticas têm conquistado um número desproporcionadamente escasso de votos. (6)

Uma política de comunicação ajuda, contribui, é um elemento vital, mas não é o único. «Sempre manifestei alguma desconfiança em relação às técnicas de “marketing” e a determinados “estilos de comunicação” que reduzem os discursos políticos a meros “slogans” para saírem nos telejornais e serem assimilados por grandes audiências. O essencial, para um dirigente político, é ter ideias próprias, objectivos claros e convicções sólidas. (…) Cito Abraham Lincoln: “É possível enganar toda a gente durante algum tempo, e mesmo alguma gente durante todo o tempo, mas não é possível enganar toda a gente durante todo o tempo”. É por isso que uma boa estratégia de comunicação se deve adaptar ao pensamento daquele ou daqueles que serve.» - Mário Soares no Prefácio de «As Presidências Abertas de Mário Soares». (7)
Com este pensamento, Mário Soares teria ficado “estupefacto” ao ler o Público de 5 de Julho de 1999, onde Manuel Maltez, o responsável da campanha do PSD, afirmou: «Sou um profissional remunerado que tenho agora como objectivo vender um partido político e vou vendê-lo como venderia um champô ou sabonete». A frase foi citada em vários jornais e por alguns políticos como sinal de exagero. Da parte dos dirigentes do PSD houve um profundo silêncio.

No lado oposto a este tipo de campanha, há o exemplo de João Soares.
Convencido que a «obra» realizada era suficiente para convencer o eleitorado em Lisboa, João Soares não quis recorrer a uma comunicação forte, a instrumentos de marketing, nas eleições autárquicas de Lisboa em 2001. Perdeu para Santana Lopes e uma das conclusões que assumiu é que a derrota foi, em parte, «por culpa própria. Aprendi que não é suficiente o trabalho feito. É preciso comunicar e dar a conhecer o projecto que defendemos», disse a Judite de Sousa numa entrevista na RTP em Julho de 2004.

O mesmo problema se tem colocado a vários governos. É frequente a referência à necessidade de haver uma comunicação eficaz com os cidadãos. Por vezes, esta dificuldade de comunicação é colocada como um dos principais problemas da governação.

Foi o que sucedeu com o executivo liderado por Durão Barroso.
Vários comentadores chamaram a atenção para a ausência de uma política de comunicação. ‘Para Marcelo Rebelo de Sousa o «Governo prepara medidas, vai tomando iniciativas, mas não tira proveito delas’. Pelo contrário, critica, «às vezes ficam grandes equívocos no ar». –DN; 10/12/2003. Nesta mesma edição o editorial do DN foi dedicado a este tema e o título era: «Comunicar é preciso», onde se explicava que «na capacidade comunicacional de um Governo repousa muito do seu trabalho político, porque o que hoje conta, verdadeiramente, são as mensagens que se passam à opinião pública».


Ciente deste problema e alertado pelas críticas, o então primeiro-ministro assumiu a necessidade de comunicação como um dos problemas da governação e, segundo conta o DN, fez dele um dos temas de um Conselho de Ministros: ‘«Precisamos de melhorar o nosso diálogo com os portugueses», apelou o chefe do Executivo.
Nessa mesma reunião, Durão pediu aos seus ministros que enumerassem as prioridades sectoriais de cada pasta para 2004. Na sua opinião, isto permitirá simultaneamente melhorar a comunicação interna e dar visibilidade externa ao Executivo no seu todo’.

A preocupação do então primeiro-ministro foi mais longe porque, a partir daqui, o governo começou a avaliar a hipótese de criar uma estrutura que coordenasse a comunicação do executivo. Esta proposta mereceu forte contestação, embora seja um processo perfeitamente normal em alguns países, como é exemplo os EUA.

Pelo que se pode perceber nos exemplos citados, há as mais variadas opiniões sobre o papel do marketing e da comunicação na política. O que parece ser unânime é que a política não pode dispensar estas técnicas de comunicação.
Até a contra gosto: «O PCP “embora não concorde com muitas das evoluções da vida política, inevitavelmente é condicionado por elas (…) Uma dessas evoluções é a personalização da campanha em torno do líder, que se tornou um pouco inevitável, nos últimos anos, pois é atrás dele que vão as televisões»” – Vítor Dias ao Público de 5 de Julho de 1999, sobre a preparação das eleições legislativas onde a CDU apresentou pela primeira vez outdoors com o rosto do líder do PCP.

Por outro lado, a capacidade de comunicação dos dirigentes políticos começa a ser um atributo determinante para as funções para as quais são eleitos ou nomeados, designadamente a liderança de uma organização política. «Tony Blair tornou-se o primeiro político britânico a assumir a liderança de um partido, porque na visão da maioria dos militantes, tinha uma grande capacidade de comunicação na televisão (…) Um dos motivos mais evocados no apoio a Blair era a crença de que era o melhor colocado para levar o Labour ao poder, devido à sua capacidade de comunicação com o eleitorado através dos media ». (8)
O mesmo disseram muitos comentadores políticos em relação à eleição de José Sócrates para líder do PS em 2004. Aliás, um dos argumentos utilizados foi a boa prestação televisiva do dirigente do PS nos debates na RTP contra Santana Lopes.

 

(1) Michel Bongrand; O Marketing Político; Publicações Europa-América;1986
(2) Mário Herreros Arconada; Teoria e técnica da Propaganda eleitoral; Coleccion Comunicación y relaciones públicas; PPU, Barcelona, 1989
(3) Público, 5 de Julho de 1999, citando declarações de Manuel Maltez, o responsável pelo marketing da campanha do PSD nas eleições legislativas de 1999.
(4) Alejandro Quintero.
(5) Sérgio Arapuã de Andrade; Como vencer eleições usando Tv e Rádio; Livraria Nobel; São Paulo; 1996
(6) Público; 23/03/1999
(7) Estrela Serrano, As Presidências Abertas de Mário Soares;
(8) Nicholas Jones; Soundbites & spin Doctors – how politicians manipulate the media – and vice versa; Indigo edition; Londres; 1996

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Mai13

A Mensagem

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O principal objectivo de qualquer organização política é provocar um determinado efeito nos eleitores que pretende atingir. Para isso, tem de escolher a melhor estratégia e a mensagem que presume ser a mais adequada para conseguir esse objectivo. Essa mensagem pode ser difundida em vários suportes - discurso oral, escrito, visual, etc.

No entanto, a mensagem não se resume a uma ideia ou a um slogan. É algo complexo, construído a partir de uma multiplicidade de factores.

Na grande maioria dos casos, a mensagem não se esgota no conteúdo das ideias e vale mais pela forma como se apresenta.

Neste processo comunicativo, quando se pretende dar a conhecer um tema, há dois caminhos que, embora complementares, podem levar a opções bem diferentes.

Pode-se recorrer ao debate, à discussão das ideias e ao aprofundamento do tema para, depois da reflexão, os cidadãos fazerem uma escolha. Procura-se a «essência das coisas», vale a razão e aplica-se o distanciamento emocional. Noutras palavras, estamos no terreno da reflexão sobre o “ser”.

O outro caminho tem a ver com a crença, com o jogo da sedução. O que é relevante não é o que sou mas o que o outro pensa de mim - a minha imagem.

É o discurso da impressão, do “parecer”.

«É na medida em que o mundo de hoje – cada vez mais dominado pela Internet e pelos media – perdeu densidade e espessura física, se volatilizou em ícones que tendem a ser arquetípicos, que o império das imagens e a forma como elas são construídas acabam por configurar uma espécie de realidade paralela, tantas vezes mais forte do que a ‘realidade verdadeira’.

Na política, a perícia e a rapidez com que se manipula este mecanismo de produção de imagens – podemos mesmo falar de uma fábrica de imagens – é hoje o campo de confronto substituto do debate ideológico. Mais do que esgrimir ideias, confrontar projectos, analisar o impacte positivo de medidas concretas, sejam dos governos ou das oposições, o importante é colar um selo, uma etiqueta, um chavão que aguça o apetite para o telejornal do dia e que marca o protagonista com um carimbo que às vezes é mortal» - Duarte Lima; Expresso nº1658; 07/0804

Aquilo a que Duarte Lima refere como a «produção da imagem» pública, de facto, não é uma especificidade dos dias de hoje.

«O fenómeno da imagem pública, particularmente na sua forma política, parece ser tão antigo quanto o próprio fenómeno da vida pública. (…) O que o traz ao centro da cena é a sua vinculação à esfera da visibilidade pública e a sua relação estreita com os meios de comunicação de massa. Embora quase conatural com a actividade política, o fenómeno contemporâneo tornou-se o que é, em termos de importância social, por causa de três factores: a) O advento da democracia moderna, trazendo consigo exigências de esfera pública; b) o advento das sociedades de massa; c) o predomínio dos grandes meios de comunicação como lugar e como recurso expressivo no qual e pelo qual se realiza a esfera daquilo que é socialmente visível. » (1)

«As novas técnicas trouxeram meios mais poderosos para a dramaturgia democrática: os meios dos media, da propaganda e das sondagens políticas. Reforçam a produção das aparências, ligam o destino das pessoas de poder à qualidade da sua imagem pública tanto quanto às suas obras. Denuncia-se então a transformação do Estado em “Estado Espectáculo”, em teatro de ilusão. O que assim se encontra sujeito à crítica, porque considerado como perversão, não é senão a ampliação duma característica indissociável das relações de poder (…) Por detrás de todas as formas de disposição da sociedade e de organização dos poderes, encontra-se, sempre presente, governante de bastidor, a “teatrocracia”. Ela regula a vida do dia-a-dia dos homens em colectividade; ela é o regime permanente que se impõe aos diversos regimes políticos revogáveis, sucessivos». - Georges Balandier (2)

Não é assim de estranhar que tenha sido Aristóteles o primeiro a conceber uma teoria sobre a persuasão - a origem (ethos), a mensagem (logos) e as emoções da audiência (pathos). O próprio Aristóteles recomendava que o orador tinha de mostrar credibilidade, ter um fio condutor na argumentação e a mensagem devia ter em conta as crenças da audiência.

A preocupação com a criação e gestão da imagem pública sempre acompanhou a actividade dos agentes políticos e hoje adquiriu maior importância.

O que pode variar é qual a função prioritária na actividade política: a produção da imagem (o image making) ou a função substantiva da actividade política: decidir em função do bem comum, fazer uma gestão adequada dos bens (sendo que ambas as funções, nunca andam separadas.)

De facto, na grande maioria dos casos, «fazer conhecer passou a ser mais importante que fazer.» (3)

Quando hoje um político critica um adversário de a sua única mais-valia ser apenas a imagem – a acusação a José Sócrates, feita por colegas de partido quando se candidatou a secretário-geral do PS em 2004 - pretende-se insinuar que o autor da acusação não se preocupa com a sua imagem pública. Nada mais falso. Com estas acusações, ele próprio está a tentar conseguir dois objectivos: determinar a «imagem» do adversário (no caso de José Sócrates – a de um candidato “de plástico”) e construir a sua própria «imagem» baseada em características supostamente menos artificiais – “o PS genuíno”.

Este tipo de discurso, que aposta na imagem, no “parecer”, é cada vez mais frequente e não apenas por ser o mais fácil de produzir.

Por um lado, nos dias de hoje, qualquer pessoa é “bombardeada” com informação. «Um norte-americano vê ou ouve em média, ao longo da sua vida, mais de sete milhões de anúncios. (…) Esta saturação de mensagens impõe ao emissor uma carga persuasiva na mensagem para conseguir chegar ao receptor». (4)

Por outro lado, este tipo de mensagem é mais eficaz porque está em consonância com os valores dominantes, o modo como cada vez mais se apreende o mundo pelas imagens, pelas metáforas, pelo audiovisual. Esta é a sociedade da sedução.

«1. A “imagem de marca” no campo da política
A “era da moda consumada” é caracterizada por Giles Lipovetsky como o “domínio dos princípios do efémero, da sedução e da diferenciação marginal, reorganizando em profundidade o contexto quotidiano, a informação e a cena política”.
A efemeridade resultaria da sedução do novo, ou mais precisamente da novidade, acelerando a marcha da obsolescência de produtos, ideias e imagens, assim induzindo a renovação contínua de ciclos de consumo.
A frivolidade é a outra face da efemeridade: os valores tradicionais, as crenças profundas, são fagocitadas pela voracidade do descartável, do facilmente digerível, do que conduz à distracção e não à concentração .
O império do efémero é assim o império das aparências feéricas, da vitrinização, da busca do “efeito espectáculo”.
(…) Vale destacar que na esfera da política a forma moda pressupõe a centralidade dos processos de produção, circulação e consumo de imagens políticas que assumem elas próprias a condição de mercadoria.
Configura-se assim um outro campo de saberes e regras operativas desse fantástico mercado das imagens políticas: o marketing político eleitoral.
»- (5)

Os vários modelos de conhecimento, a aprendizagem das narrativas, o modo como se conta uma história, são cada vez mais determinados pelos meios audiovisuais.

O principal acontecimento do mundo, num determinado dia, não passa de uma história de dois minutos, contada através de imagens e numa linguagem simples e directa. Todas as outras histórias passam por esta grelha, para não se tornarem aborrecidas.

O mesmo se passa na política.
A mensagem de um líder partidário, para ser difundida pelos media, é determinada por essa grelha.

Os comentadores exigem aos políticos este tipo de discurso, caso contrário consideram que estes não têm perfil para o cargo (foi de certa forma o que sucedeu com Vítor Constâncio e Manuela Ferreira Leite cuja capacidade técnica foi ofuscada pelas dificuldades de comunicação).
Por último, os receptores, os eleitores, vão dando sinais de que a mensagem com maior receptividade é aquela que não exige grandes reflexões, que seja simples e agradável q.b.

 

Ver ainda: Construir a imagem


 

(1) Wilson Gomes; a Política de Imagem. Wilson Gomes é doutorado em Filosofia e professor do Departamento de Comunicação da Universidade Federal da Bahia.
(2) Georges Balandier; O Poder em Cena; Éditions Balland, 1992; Minerva
(3) Omar Gais; Espectaculo Y Ciudadania. La politica en los médios; Facultad de Ciencias Políticas y Sociales Uncuyo; Mendonza
(4) Anthony Pratkanis, Elliot Aronson; La era de la propaganda – uso y abuso de la persuasión;; Oaidós Comunicación; ; Barcelona; 1994
(5). Rejane V. Accioly Carvalho; Imagem Marca e Reeleição: A campanha presidencial de FHC em 1998;

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Mai13

1. Uma mensagem envolvente

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Vários estudos mostram que as emoções reforçam a eficácia da comunicação persuasiva. No estado de paixão, por mais explicações racionais que se procurem, há sempre uma razão que a razão desconhece.

Na comunicação política passa-se o mesmo. Os responsáveis de marketing político sabem que a persuasão mais eficaz é aquela que é mais agradável e mais envolvente.

Diz Roger Ailes, em “You are the message”, que o elemento mais importante da comunicação é «ser agradável. Dominando este elemento mágico, porque você agrada a uma audiência, perdoam-lhe quase tudo o que fez de mal. Se não lhes agrada, por muito boas que sejam as suas propostas, será irrelevante».

A mensagem com mais eficácia não implica raciocínios elaborados. “Na realidade, as mensagens propagandísticas de tipo racional tiveram e têm muito pouco êxito. Uma aproximação aos sentimentos das audiências, completada ou não por uma mensagem racionalmente elaborada, foi e é o único caminho da propaganda” - Alejandro Quintero (1)

 Para se conseguir este efeito opta-se, preferencialmente, por apelar à crença e às emoções.  
 O destinatário da mensagem não se sente coagido. É o que John Kenneth Galbraith chama “o poder condicionado”: não é visível, consiste na persuasão e na crença, “naquilo que o indivíduo, no contexto social, foi levado a acreditar e que se torne, para ele, intrinsecamente correcto.
 A aceitação social do poder condicionado aumenta tanto mais quanto se caminha do condicionamento explícito para o implícito”. (2)

Se um indivíduo estiver cativado através das emoções, das sensações, do interesse que a mensagem transmite, coloca menos filtros e é mais receptivo. Não só se sente envolvido, como coloca menos resistências à mensagem que lhe é transmitida. Além do mais, cria um laço de “fidelidade”: é mais difícil alterar uma opinião criada por emoções, por uma crença, do que uma opinião racionalizada.

Neste sentido, os políticos – à semelhança da mensagem publicitária - quando pretendem transmitir uma mensagem, tentam evitar a sensação de que estão ali para tentar convencer alguém - a “vender banha da cobra”.

Ao contrário, procuram dar a impressão de que estão ali para uma missão que, em geral, é de «defesa do bem comum».

De certa forma, esta é também a regra da própria comunicação social.
Um jornal, um noticiário, não é elaborado para convencer os receptores da veracidade e da importância das notícias – não está lá escrito: «isto é verdade». Para o jornalista e para o consumidor, a apresentação de determinado acontecimento num formato «informativo» é o suficiente para ser “verdade”. A objectividade não passa de um preconceito.

No entanto, o produto informativo, ele próprio tido como «objectivo», é, cada vez mais, produzido com técnicas para despertar o interesse do receptor e «agarrar» as audiências. Uma das técnicas mais recorrentes é a dramatização, que «nada mais é do que o esforço de tornar uma narrativa mais interessante, comovente, com vida, dando assim importância ao seu teor». (…) Um telejornal é um produto de uma emissora. Para atrair público/consumidor precisa cada vez mais, devido à crescente concorrência, de apresentar conteúdos diferenciadores através de formas diferenciadas. Ou seja, o seu material humano, quanto mais humano for lato sensu, mais personalidade agregará ao produto. Notícia por notícia, os computadores podem fornecer via Internet. Notícia com interpretação e vivacidade faz a diferença.» - Ivonete Pinto (3)

Por outro lado, este tipo de mensagem atinge audiências maiores porque vai ao encontro da preferência da maioria dos telespectadores. «Segundo um estudo sobre as motivações das pessoas quando vêem ou escutam um telejornal, a grande maioria deseja estar bem, passar bem o tempo. Estar informado é apenas um pretexto ou uma razão secundária para sentar-se em frente do televisor.» (4)

No início da década de 80 um responsável da RTP, Cesário Borga, afirmava que os directores de programas encaravam os telejornais com grande preocupação porque provocavam uma quebra de audiência no “prime time”.

Hoje o jornalismo televisivo evoluiu de tal forma que os telejornais são dos programas com maior audiência.

A razão é simples. O próprio modelo da informação adaptou-se a uma linguagem mais próxima do jogo da sedução e das emoções. Nem sempre a notícia de abertura de um telejornal é sobre um facto que tem grandes consequências no dia-a-dia do telespectador. A maior parte das vezes satisfaz apenas a curiosidade mórbida sobre situações muito particulares como um crime, um acidente, uma desavença familiar. Para o editor de um jornal televisivo, um facto não é valorizado pelas consequências que pode ter na sociedade.

O que é importante num acontecimento é que ele possa ter os ingredientes necessários para dar o que na gíria jornalística se chama uma “boa história” – ou seja, apelativa para as audiências. Nas palavras do investigador Thomas Patterson, «as notícias estão a perder a sua identidade e a parecer-se cada vez mais com produtos comerciais». (5). Citando um antigo director da BBC, Mark Levy, «um espaço informativo em televisão não é mais do que um passatempo, como outro qualquer».

De todos os meios de comunicação social, a televisão é a que mais recorre a este discurso envolvente. A principal janela para o mundo, que molda a “realidade” de muitas pessoas, vive das emoções e dos sentimentos – numa reportagem de um minuto nada se pode explicar, tudo se resume a uma impressão. Esta é uma comunicação que não provoca um distanciamento, uma postura activa e crítica de quem recebe a mensagem. Pelo contrário, provoca a passividade do receptor.

Passivo e dependente das imagens que a televisão lhe dá a conhecer, o telespectador acaba por dar maior credibilidade a essas imagens e orientar os seus pensamentos e comportamentos de acordo com a visão do mundo que lhe é transmitida.

Se muitos dos produtos informativos tiveram de recorrer a estas técnicas para se afirmar num meio profundamente competitivo, o mesmo fizeram as organizações políticas. Mais ainda, porque parte significativa da comunicação política é efectuada através dos meios de comunicação social. Saber dominar estas técnicas é um dado fundamental para conseguir fazer passar a mensagem.

Hoje é impensável a actividade política dispensar o recurso aos meios de comunicação social.
A classe política foi obrigada a adaptar-se à linguagem e à organização dos media.
Na verdade, muitos políticos aprenderam esta lição e não fizeram mais do que adaptar a sua comunicação a estes critérios editoriais.
Se a abertura de um telejornal obedece a um critério que selecciona um acontecimento porque tem os ingredientes necessários para cativar as audiências, os políticos começaram a «criar» esses acontecimentos tão do agrado dos jornalistas.

Por vezes, culpam-se os políticos de recorrer a esta estratégia de comunicação. Na verdade, lutam pela sobrevivência, limitam-se a seguir um critério «jornalístico».

Nas sociedades democráticas é o jornalista ou o produtor de um programa que define quem tem acesso ao palco. Fica ainda nas mãos do editor a capacidade de definir os conteúdos, de dar o livre-trânsito a uma mensagem, desde que o convidado respeite determinados requisitos. Ou a classe política aprende a utilizar o discurso que joga com a emoção, o espectáculo, o drama, a sedução, ou então … fica de fora do “quarto” do poder.

É frequente nas reuniões de planeamento de muitos órgãos de comunicação social ser discutido quem vai ser o entrevistado para um determinado programa. Alguns nomes são apresentados e, muitas vezes, são excluídos porque são pessoas «chatas». Ao contrário, quem dá bons títulos, usa frases-chave, provoca polémica…. quase sempre tem a porta aberta. E são, quase sempre, os mesmos.

O impacte deste tipo de comunicação na própria actividade política é a personalização. São retirados do debate os problemas estruturais, o confronto de grupos de pressão ou interesses abstractos. Muita da actividade política é descontextualizada e resume-se a um confronto entre personalidades.

Outro efeito é a permanente necessidade de construção de um discurso assente na dramatização. Devido ao tempo e espaço mediático, as organizações políticas têm de produzir um discurso vivo, com grande impacte nos consumidores dos mass media. Um tema ou uma abordagem, por mais relevante que seja, se não tiver a vivacidade exigida não tem uma existência «real», porque não passa nos meios de comunicação social.

Por último, outra consequência é a fragmentação das mensagens políticas. Porque o tempo mediático é reduzido, nunca há tempo para se contar uma “história”. A mensagem tem de ser parcial, tem de se escolher o fragmento mais adequado, a perspectiva mais útil…


 

(1) Alejandro Quintero
(2) Anatomia do Poder
(3) Ivonete Pinto; A dramatização no telejornalismo; Famecos/Puccrs
(4) Anthony Pratkanis, Elliot Aronson; La era de la propaganda – uso y abuso de la persuasión; Oaidós Comunicación; ; Barcelona; 1994
(5) DN; 22/04/1998

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Mai13

2. A mensagem negativa

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Um dos processos habituais em comunicação política é a mensagem negativa.

Quase todo o discurso político recorre a acusações, críticas, denuncias…cartaz do PSD para legislativas de 2002

Apesar de não haver unanimidade sobre a ética e os efeitos de uma mensagem negativa, a tendência da comunicação política é recorrer com frequência a este tipo de mensagem.

No entanto, há quem pense que uma mensagem profundamente negativa pode provocar uma reacção de antipatia, penalizando o seu autor, porque provoca no receptor uma sensação de desagrado e de desconforto.

 

Estudos efectuados nos Estados Unidos mostram também que o recurso à mensagem negativa pode levar ao afastamento dos eleitores. As críticas permanentes e o “lavar decartaz do BE sobre Fernando Nogueira e Durão barroso roupa suja” em público propiciam uma atitude de afastamento do eleitorado indeciso. “Os políticos são todos iguais, para quê mudar”?

Por um lado, a propaganda nos média pode, com frequência, incentivar os militantes e simpatizantes a votar no seu partido; por outro lado, a mesma propaganda está a aumentar significativamente o número dos que passam da independência para a apatia, se não mesmo para a antipatia, em relação a várias instituições políticas.(…) A campanha negativa ou de “ataque” suprime a vontade de mudança. Os anúncios negativos até podem ser usados para este objectivo.” (1)

 

O recurso sistemático a mensagens negativas tem ainda um efeito a médio e longo prazo: é a crispação entre os candidatos. «A experiência, em especial nos Estados Unidos, tem mostrado que é muito fácil “resvalar para as tentativas de destruição de pessoas e de vidas familiares”. Daí o aviso: “O melhor é não começar.” »– Público de 29 de Julho de 1999 sobre declarações de António Guterres no arranque da campanha eleitoral.

 

A crispação originada pela campanha negativa provoca ainda outro problema a nível institucional: dificulta as relações entre os dirigentes partidários, por vezes ao longo de uma legislatura, impedindo entendimentos e uma acção política mais construtiva.

 

Um dos exemplos mais recentes foi o ataque mútuo entre Paulo Portas e Durão Barroso nas legislativas de 1999, o que contribuiu decisivamente para um mau relacionamento entre os dois líderes no período seguinte às eleições, inviabilizando durante muito tempo entendimentos à direita do PS. O mesmo se passou em 2002, provocando muitas dúvidas sobre a natureza da coligação governamental e uma grande inquietação em relação ao comportamento de Paulo Portas.

 

Em muitas situações deste género o eleitorado não entende a postura de agressividade e o tacticismo aplaudido pelas elites é rejeitado pelo cidadão comum.

 

Uma outra consequência é o reforço da perspectiva populista de que os políticos são corruptos, estão afastados dos problemas das pessoas….

No entanto, apesar destas reacções de rejeição, outros especialistas consideram (e a própria experiência também o tem revelado) que, entre outras vantagens, é mais fácil memorizar uma mensagem negativa do que uma referência positiva.

É possível, no entanto, encontrar aqui uma simbiose que propicie uma mensagem eficaz.

 

Seguramente, uma das formas mais eficientes de transmitir uma mensagem negativa é através do humor e da ironia. Um dos exemplos mais citados é o da campanha de Richard Nixon que foi fortemente abalada por cartazes que o mostravam com ar de intrujão e com a seguinte pergunta: “você comprava um carro em segunda mão a este homem?”.
Ou seja, trata-se de uma mensagem com um conteúdo negativo, mas cuja forma propícia uma sensação de descontracção.

 

Nas presidenciais de 2004 dos EUA, seguiu-se o mesmo principio mas recorrendo a novas tecnologias.

«CORRIDA À CASA BRANCA
Videojogos seduzem candidatos

Desconhece-se se a moda veio mesmo para ficar, mas, de momento, é a grande febre na corrida à Casa Branca: a criação de videojogosjogo da campanha de kKerry contra George W. Bush
(…) Um dos jogos que tem feito mais furor é uma paródia ao conhecido jogo “Space invaders”, com o título “John Kerry: tax invaders”, em que o utilizador controla a cabeça do actual presidente e candidato republicano, George W. Bush, que dispara contra as supostas subidas de impostos por parte de John Kerry, o nome proposto pelos Democratas para a Casa Branca. (…)
Confrontados com os ataques, John Kerry e seus pares não tardaram a entrar no jogo. A resposta surgiu sob a forma de uma sátira chamada “Kick Bush out”. Nesta caricatura interactiva, o participante é convidado a desferir três patadas de burro - animal que simboliza o Partido Democrata - na figura do actual presidente. Os resultados obtidos dependem da destreza e rapidez dos jogadores
políticos que satirizam os principais candidatos à Presidência dos Estados Unidos da América.» JN; 13/07/04

 

Após a revolução de 1974 um instrumento muito utilizado foi a banda desenhada.

A candidatura de Pinheiro de Azevedo à Presidência da República em 1976 recorreu quase exclusivamente ao humor, o que, de certa forma, correspondia à personalidade do candidato.

Este processo pode ter efeitos mortíferos, mas antes, terá se ser bem testado e concretizado. O humor e a ironia, se forem mal feitos, dificilmente passam nos média e até provocam ruído na comunicação.

 

Um outro factor que contribui para o sucesso deste tipo de comunicação é o de que a ideia negativa que se quer transmitir já deve ter um rasto. As características negativas que são apontadas não podem ser uma absoluta novidade. No mínimo, para ser eficaz, os receptores devem ter uma «impressão» do conhecimento de alguns dados – mesmo que vagamente.

 

A mensagem negativa que é transmitida funciona como reforço ou validação dessa impressão ou do «dizem por aí… afinal é verdade». Assim se dá crédito a um boato, tirando-se partido do «senso comum».

Foi o que fizeram os defensores do “Não” no referendo sobre a regionalização em 1998, ao tirar partido da desconfiança generalizada do eleitorado. Vários estudos de opinião divulgados nessa altura pelo D.N. colocavam a classe política entre as mais desacreditadas.
Segundo Margarida Ruas dos Santos (Diário Económico de 10/11/1998), a campanha do “Não”, «do ponto de vista dos valores foi das mais negativas feitas em Portugal. Exploraram e julgaram os medos colectivos de forma pouco escrupulosa».

As mensagens utilizadas na campanha do referendo que incidiam na probabilidade de mais corrupção, mais clientela, não faziam mais do que explorar essa desconfiança relativamente à classe política.

É aliás curioso verificar que após rebentar o “caso JAE”, com alegadas situações de corrupção, favorecimento e financiamento dos dois maiores partidos políticos, o “Sim” à regionalização deixou de subir em vários estudos de opinião.

 

Também à «boleia» do boato andou o PSD de Santana Lopes nas legislativas de 2005. Mas aqui o efeito não terá sido muito positivo.
Tudo começou num boato cujo foco ocorre em Lisboa, pouco depois de Sócrates ser eleito secretário-geral do PS. O rumor vai fazendo o seu caminho, ganha contornos vários e, para os dirigentes socialistas, o «alerta» tocou numa entrevista do então ministro José Luís Arnault ao Expresso, pouco depois de Jorge Sampaio convocar eleições antecipadas. Interrogado acerca das propostas do novo líder do PS, Arnaut respondeu que preferia saber o que Sócrates pensava sobre outras questões, como por exemplo «se é a favor de casamentos entre homossexuais. Eu não». A afirmação do dirigente do PSD é «forçada». Nada justificava levantar este tema. A justificação era o boato.
Com o aproximar da campanha eleitoral surgiam sinais de que o boato estava a ganhar uma grande dimensão. Alguns estudos qualitativos indicavam que o boato era do conhecimento de várias pessoas, em várias zonas do país e de vários estratos sociais e económicos. Nesta altura começaram as dúvidas entre os dirigentes do PS sobre a forma mais indicada para um desmentido. José Sócrates opôs-se a qualquer iniciativa.

No início de Janeiro de 2005, «um obscuro jornal brasileiro trouxe uma notícia, daquelas de coluna social, sobre os candidatos às eleições em Portugal. Na notícia liam-se alusões caluniosas sobre a vida privada dos candidatos. Essas alusões foram transportadas para um jornal português, daqueles de bas- -fond, muito tablóide.» (o Crime)
«Primeira observação sobre este método é um modelo clássico de manipulação, utilizado por serviços de informação e por polícias secretas. Consiste em, quando não há possibilidade, por causa da legislação ou dos costumes, de colocação de um boato num determinado país, conseguir a sua publicação num jornal estrangeiro e, depois obter o transporte para um jornal desse país, disponível para o publicar escudando-se no facto de esse dado já ter sido tomado no estrangeiro. É uma técnica conhecida e tudo menos inocente.
Trata-se de um boato plantado por quem sabe plantar boatos. Até aqui, estamos perante um mecanismo de lançamento ou de amplificação de um boato.
Infelizmente, foi usado por uma campanha eleitoral [PSD]. Não digo que a campanha tenha sido a autora do mecanismo de amplificação, digo que essa campanha utilizou os elementos do boato
.» Pacheco Pereira; DN; 04/02/05
Os factos a que Pacheco Pereira se refere neste texto de opinião são os cartazes da JSD e a intervenção de Santana Lopes num comício em Famalicão, com mulheres.

Os estudos de opinião revelavam que José Sócrates era desconhecido do eleitorado. As pessoas não tinham uma opinião definida sobre o seu carácter e a sua competência.. Este terá sido o motivo porque o PSD tentou fazer passar a ideia de que votar no líder do PS era apostar no desconhecido. O cartaz da JSD não tinha outro objectivo. Pela primeira vez um líder partidário era usado num ‘outdoor’ de uma candidatura adversária, mas pouco mais de inovador havia neste cartaz. O problema surgiu quando o PSD começou a relacionar este desconhecimento sobre José Sócrates com outras questões, designadamente a do boato.
Por um lado, «subitamente, foram levantados temas como o casamento dos homossexuais». Por outro lado, «há um terceiro elemento, este da responsabilidade directa do primeiro-ministro, como, aliás, os outros, o chamado comício das mulheres. Foi uma apologia do machismo. O candidato foi apresentado como correspondendo ao paradigma do macho lusitano, com todas as virtudes de masculinidade, e [Santana Lopes] embarcou neste tipo de linguagem juntando-lhe uma série de frases ambíguas sobre o colo».
A frase sobre «o colo» a que Pacheco Pereira se refere foi a «gota de água» neste processo.
«“Este homem é conhecido pela sua natureza sedutora”. Do púlpito, Augusta Ferreira, doméstica, dirigiu-se com estes modos a Pedro Santana Lopes. Em delírio, as mais de mil mulheres presentes no almoço de Famalicão mostraram partilhar desta apreciação. A seguir, foi a vez de Manuela Cardoso levar a sala ao êxtase: “Ele ainda é do tempo em que os homens escolhiam as mulheres para suas companheiras”, afiançou esta funcionária pública, lembrando que Deus assim o quis. “Bem-haja os homens que amam as mulheres!”, sentenciou ainda. “O outro candidato (José Sócrates) tem outros colos. Estes colos sabem bem”, confessou Pedro, no final aos jornalistas». Relato de Alexandre Praça no Público; 30/01/2005
Esta frase foi proferida no dia 29 de Janeiro, num sábado. No domingo ganha eco com esta notícia no Público. Relevante foi ainda o comentário de Ana Sá Lopes, nesta mesma edição:«o homem já não tem nada para vender. Resta-lhe o currículo conhecido do eleitorado através das ‘revistas do coração’, (…), Ontem lançou o mais estranho mote da campanha eleitoral: votem em mim porque eu gosto de raparigas. Chegámos ao patamar que nunca pensámos atingir na política. Só um miserável – e quem é Santana Lopes, neste momento do campeonato, senão um pobre despojado de qualquer bem válido para a polis? – pode utilizar em comícios, como aquele em que ontem participou, com 1000 mulheres, em Braga, o facto de ser aquilo a que se chama um femeeiro”». Público; 30/01/05. Este comentário foi publicado em vários blogues e parte do texto citado em vários jornais.
Nos dias seguintes a frase é citada em vários órgãos de comunicação social. Se até esta data o PSD não podia ser acusado de algo em concreto, com esta frase, a situação inverteu-se, multiplicando-se os comentários fortemente críticos contra o líder do PSD. Por outro lado, a frase do líder social-democrata permitiu a José Sócrates encontrar um motivo para negar o conteúdo do boato e, ao mesmo tempo, lançar uma ofensiva política que condicionou fortemente o PSD. A resposta foi dada na terça-feira seguinte, numa entrevista na RTP1. Para criar expectativa, logo pela manhã, Jorge Coelho
afirmou que «os socialistas não vão seguir o exemplo dos adversários e vão fugir às ofensas e ataques pessoais. (…) como todos sabem, têm havido insinuações, rumores, nas rádios, nos jornais e nas televisões, têm sido ditas coisas nesta campanha que eu acho que não são dignas de um confronto político que deve ser de ideias e não de calúnias». TSF, 01/02/05.

À noite, José Sócrates foi entrevistado por Judite de Sousa e afirmou ser «incompreensível que o líder do PSD utilize como arma política uma onda de boatos e insinuações. (…) Isto passou as marcas. Tenho vindo a ser alvo de uma campanha de boatos absolutamente falsos, mentirosos, ridículos até (…) Houve acusações brejeiras de um líder partidário. Tenho de falar nisso, não para me defender a mim, mas para defender a minha família e os meus filhos».
Depois desta entrevista e das reacções publicadas na comunicação social, inclusive de dirigentes do PSD que se demarcaram de Santana Lopes, os sociais-democratas terminaram com as insinuações.
Primeiro tentaram justificar «o colo» - «a frase do nosso líder não permite extrapolações»,
disse Pedro Pinto. Clarificou que o «colo» a que Santana Lopes se havia referido no sábado envolvia uma referência política e não outra e que o líder do PS precisa desse «colo», pois «nada» tem feito pelo país.».  O próprio Santana Lopes foi obrigado a alterar o discurso, negando que alguma vez tivesse feito qualquer insinuação: «O que sei do engenheiro Sócrates é que ele é divorciado, pai de filhos, como eu. Quero que os portugueses votem nos líderes políticos em função das propostas que têm para a sociedade». DN; 02/02/05.
O PSD não voltou a pegar no tema do boato e terminou com a mensagem baseada no desconhecimento do líder do PS. Mudou de estratégia. A referência negativa deixou de incidir em exclusivo sobre o líder do PS e passou a abranger vários dirigentes socialistas, tentando tirar proveito da ligação desses dirigentes aos governos de António Guterres.

 

Uma mensagem negativa deve ter ainda em consideração os valores e a tradição do eleitorado a quem se dirige essa mensagem, para evitar um efeito «boomerang».

 

Há um caso na história recente da comunicação política em Portugal e que foi retirado devido ao receio de provocar efeitos perversos: o “General Balança”. Foi uma ideia desenvolvida nos tempos de antena do PS em 1987, contra o PRD, um partido da iniciativa do general Eanes e que tinha como símbolo uma balança. O conceito dos tempos de antena era, através do humor, acentuar as indecisões do general e a alegada influência que era exercida pela sua mulher. O tempo de antena era mortífero mas, talvez por ser um género inédito em Portugal, originou contestação (e receios de dirigentes do PS, nomeadamente de Vítor Constâncio, que deu ordens para anular a emissão de vários episódios que já estavam produzidos), e apenas foi editado um tempo de antena. (2)

 

Embora com menos impacte e polémica, um outro tempo de antena, com uma mensagem marcadamente negativa, teve lugar em 1995, da autoria do PP. A descrição é do jornalista Paulo Moura, no Público de 20/09/95: “imagem a preto e branco, com muito grão. Ouvem-se sinos a tocar o dobre de finados, banda sonora que se prolonga por todo o «spot». Uma menina com uma mochila da escola vai sozinha pela rua, alegre e distraída a olhar as árvores. Passa por um arrumador de automóveis, com a camisa fora das calças e a barba por fazer. A câmara começa a fazer «traveling» rápido por grades e muros, como num filme de «suspense». Uma letragem enche o ecrã: «1994: os crimes violentos aumentaram 25 por cento». No seu percurso, a menina cruza-se com outro tipo «mal-encarado», de barba rala, que aparentemente passa droga a um outro, de óculos escuros. Há uma troca de olhares desconfiados. Letragem: «1994: foram assaltadas 128 lojas por dia.» A partir daqui, tudo se torna inverosímil, como se passássemos a ver a realidade pelos olhos de uma menina assustada que vê fantasmas e papões. Dois tipos saem de uma loja a fugir. A miúda começa a correr, em pânico. Letragem: «1994: foram assaltados oito carros por hora.» Um homem quebra o vidro de um carro para o assaltar. Ouve-se uma gargalhada de filme de terror. A miúda continua a correr, fecha-se em casa. No ecrã, aparecem as fotos de Nogueira e Guterres: «1992: PS e PSD aprovaram a redução de penas para traficantes de droga.». A miúda surge a uma janela gradeada. Voz: «Os portugueses estão presos dentro de casa, enquanto assassinos e traficantes andam em liberdade».”

Na história da Democracia portuguesa há outros casos de recurso sistemático a uma mensagem negativa, mesmo no plano pessoal.

Um dos exemplos mais conhecidos teve Sá Carneiro como alvo.

 

Além do lançamento de notas com o rosto de Sá Carneiro, foram distribuídos vários documentos que acusavam o líder da AD de não ter pago uma dívida contraída num banco e de, alegadamente, ter recorrido a um processo fraudulento.

 

Um outro caso que provocou alguma polémica foi um cartaz e um autocolante do PSR, na pré-campanha das legislativas de 1995

Nas eleições legislativas de 1999, na pré-campanha, o PSD avançou com algumas iniciativas de campanha negativa, de que foram exemplo o livro “Promessas”, o cartaz com a rosa do PS a murchar e a acusação de João Jardim que chamou mafioso ao então primeiro-ministro.

anúncio do PSD ao livro das promessasO recurso a estes instrumentos de campanha negativa levou mesmo António Guterres a fazer uma intervenção política em jeito de aviso: “o melhor é não começar. A experiência internacional revela que quando se dá início a uma campanha pela negativa sabe-se onde começa, mas nunca se sabe como acaba”. Só que, nesta intervenção, António Guterres disse ainda que uma campanha negativa “muito rapidamente resvala para as tentativas de destruição de pessoas e de vidas familiares”. Esta frase foi entendida por alguns comentadores e pelo próprio líder do PSD como uma ameaça e, também ela, uma acção de campanha negativa. É que, nessa altura, corria um rumor acerca de antigos problemas familiares de Durão Barroso.
Para quem tinha conhecimento do rumor, a afirmação de António Guterres era igualmente assassina. Dirigentes políticos do PS próximos de António Guterres garantem que não foi essa a intenção. “Nestas palavras, Barroso viu uma «chantagem», como se Guterres tivesse na manga informações íntimas sobre adversários e ameaçasse divulgá-la!
Os dois líderes dos dois maiores partidos devem das duas uma: ou declararem que há um mal-entendido nesta história ou desistirem da pose de gente de bem quando se encontram. Porque está lançada a suspeita de haver um relacionamento canalha
.” – Tal&Qual 06 Agosto, 1999.

 

Uma outra situação teve a ver com o caso das «viagens fantasma» dos deputados e da suspeita gerada em volta de António Guterres. O líder do PSD andou mais de uma semana a questionar o primeiro-ministro, conseguindo, de certa forma, desgastar a imagem de Guterres. Face a estes ataques, o líder do PS utilizou quase toda a campanha para avançar com um processo de vitimização. Com esta estratégia, António Guterres conseguiu recuperar parte da sua popularidade e Durão Barroso acabou por ficar com uma imagem de pouca simpatia e maior agressividade. Tal como já foi referido, lançar uma campanha contra uma pessoa muito popular, “limpa” de qualquer pecado, pode ser uma acção arriscada. Só funciona se houver provas contundentes, claras, sem qualquer margem de dúvida. Caso não funcione, tem um efeito nefasto no autor da acusação.

 

Em outros países repetem-se estas situações de campanhas negativas. Nos

EUA é frequente este tipo de comunicação devido ao recurso a ‘spots’ comerciais.


 

 

Um dos casos mais emblemáticos teve lugar em 1988. Foi a campanha de George Bush contra Michael Dukakis e um dos pontos altos foi o “spot” de Willie Horton. Provocou a ira de vários comentadores e associações cívicas, por apelar ao racismo, mas provocou também um grande desgaste na imagem do candidato democrata. «A propaganda republicana não apenas estabeleceu a agenda dos media quanto à campanha, levando-a a destacar um tema que era do seu interesse, como também impôs à cobertura dos media o seu próprio enquadramento (framing) acerca do tema: o vocabulário republicano impregnou profundamente as reportagens que, depois da exibição da propaganda republicana, passaram a adoptar, de forma atípica, uma “linguagem de tablóide de tortura e terror” para descrever o episódio.» - Kathleen Hall Jamieson em “Dirty Politics: Deception, Distraction and Democracy” citada por Silas Andrade
O efeito ainda foi mais nefasto para Dukakis porque durante muito tempo o candidato democrata recusou responder a esta ofensiva.

 


 

Ainda nos EUA, um dos casos mais conhecidos - e que hoje é apontado como um clássico da campanha negativa - foi em 1964 o spot de Lyndon Johnson contra o republicano Barry Goldwater.

"Daisy Girl" foi um forte ataque político onde se insinuava que o adversário político poderia inicar uma guerra nuclear.

 

a galinha dos tories

 

Em 1997 a luta entre Major e Blair, na Inglaterra, também teve facetas negativas. Uma delas irá ficar na memória. Pretendendo atacar a imagem de Blair, de só “cacarejar”, os conservadores colocavam uma “galinha” nas proximidades das principais acções do Labour,.

A resposta não se fez esperar. Ao lado dessa galinha o Labour colocava outra, mas sem cabeça. Com esta resposta rapidamente terminou a rábula das galinhas, embora tivessem entrado na história das campanhas britânicas.

 

Tony Blair’s seeming unwillingness to engage in a head to head debate with John Major saw him labelled a “chicken” by the prime minister. To press the message, Tory Central Office employed a man in a chicken suit to follow Mr Blair.

The Tory chicken unleashed a menagerie of publicity stunts the like of which the British electorate had never seen before. By the end of this brief interlude, headless chickens, foxes, teddy bears and even a rhinoceros had all made a brief appearance on the political stage. Although exactly what causes they were trying to promote still remains unclear.
BBC
blair num cartaz dos toriescartaz dos conservadoresNestas eleições, os conservadores tiveram uma outra iniciativa que provocou polémica: um cartaz com uma montagem de uma fotografia de Blair com olhos de “diabo”.
A iniciativa não teve sucesso e os «Tories» foram obrigados a arrepiar caminho. Um dos elementos centrais da campanha dos conservadores era criar o receio da mudança.

Nas eleições seguintes foi ao contrário. Thatcher fez duras críticas ao governo de Blair e à eventual adesão ao Euro, o que levou vários comentadores a sugerir que era a «Dama de Ferro» que ainda mandava nos «Tories». Aproveitando a ideia, o Labour fez um outdoor onde o líder dos conservadores aparecia com a cabeleira de Thatcher.

 

 

Há várias explicações para o recurso frequente à publicidade negativa:
 é mais fácil fazer publicidade negativa, nomeadamente nos países onde é permitida a utilização de spots comerciais;
 é mais fácil o recurso a situações negativas porque, mesmo sendo casos pontuais, podem aparecer como regra (pode-se ter melhorado o atendimento nos hospitais, mas se a visita às urgências de uma unidade de saúde mostrar uma longa fila, macas no corredor…, a força desta imagem pode anular a ideia das melhorias que foram conseguidas).
 é mais fácil assegurar a cobertura dos media (3);
 os media adoptam mais facilmente o discurso, os “sound bites” das campanhas negativas;
 Se a acusação tiver receptividade dos órgãos de comunicação social, ao fim de algum tempo é difusa a fonte de informação. Para muitos, já não se trata de uma mera acusação levantada por um partido, mas antes, um caso levantado por um órgão de comunicação social, uma investigação jornalística ou criminal….
 com o desgaste crescente da classe política obtém-se a garantia de maior receptividade junto do eleitorado quando se critica um político - em Portugal, o PP de Manuel Monteiro recorria frequentemente a este discurso e, com grande frequência, conseguia obter algum eco na comunicação social;
 pode ser útil recorrer à técnica de demarcação convencendo o eleitorado que a força política adversária é pior. Este argumento encontra justificação quando vários estudos de opinião mostram que, para muitos eleitores, o voto foi determinado, não por grande convicção no partido em que se votou, mas, porque as alternativas eram consideradas piores;
 a possibilidade de se obter dividendos da dramatização, ao serem colocados cenários de crise, de apocalipse, se a outra força política ganhar. Este processo é mais usado por quem está no poder, essencialmente se o ambiente não for favorável à mudança; (4)
 por último, vários estudos mostram que, surtindo efeito, a mensagem negativa tem uma repercussão imediata nas sondagens, conseguindo fazer baixar a popularidade da organização adversária. Em alguns momentos, este efeito pode contribuir para uma maior mobilização, a chamada «dinâmica de vitória».

 

Duas notas finais. Há situações em que aparentemente não existe uma mensagem negativa, mas onde o efeito é quase idêntico.

 

Vários estudos mostram que a simples associação a um comportamento censurável (mesmo em situações em que seja negada essa relação), provoca um efeito negativo no eleitorado.
Um exemplo: Marcelo Rebelo de Sousa, em Abril de 1998, acusou “o governo de ter negócios obscuros com alguns grupos económicos”. A acusação provocou uma onda de indignação de membros do governo e de empresários. Como afirmou Leonardo Ferraz de Carvalho (Independente, 24/04/98) se o então líder do PSD, em vez de fazer a acusação directamente, tivesse feito uma pergunta – “o governo está a privilegiar grupos económicos?” -, poderia ter provocado um desgaste no governo (criando a dúvida, colocando em debate um tema que podia lançar suspeitas), evitando tornar-se ele próprio o alvo das reacções contundentes.
cartaz do PSDPercebendo o erro, as ofensivas seguintes do PSD já seguiram esta sugestão: muitas perguntas, com algumas insinuações pelo meio e uma outra ideia de fundo: “Não ter medo de dizer a verdade…”., citando Sá Carneiro

Ainda segundo os mesmos estudos e pegando no mesmo exemplo, a simples frase: “O governo não privilegiou grupos económicos”, provoca igualmente uma reacção negativa no eleitorado. Apesar de negada, a simples associação a um comportamento censurável provoca desconfiança nas pessoas.

 

Segunda nota. É frequente uma campanha negativa procurar atingir um efeito de medo nas pessoas. Foi assim que George W. Bush ganhou as presidenciais de 2004. Criticou Kerry por não ser suficientemente forte na luta aos terroristas e reafirmou que os norte-americanos podiam contar com ele na defesa das suas vidas e dos seus interesses.
Bush conseguiu mesmo transformar situações controversas em exemplos da sua luta contra os terroristas que funcionam em rede e que atacaram os Estados Unidos.
«O recurso ao medo tem maior eficácia quando: 1) produz um sério sobressalto; 2) apresenta uma recomendação concreta para superar a ameaça indutora do medo; 3) as medidas propostas são avaliadas como positivas para atenuar a ameaça: 4) a pessoa que recebe a mensagem crê que pode desenvolver a acção que é sugerida. (…) Nem todos os apelos ao medo funcionam. Quando a comunicação de uma mensagem suscita um medo extremo, temos a tendência de não prestar muita atenção» - Anthony Pratkanis, Elliot Aronson em “La era de la propaganda – uso y abuso de la persuasion; Oaidós Comunicación; ; Barcelona; 1994.

 

 

(1) Going Negative; Stephen Ansolabehere; Shanto Iyengar; Free Press; N. Y. 1995

(2). Num comentário no Diário de Noticias sobre os tempos de antena, no dia 1 de Julho de 1987, J. Fragoso Mendes escreveu “A «subversão» do discurso veio de onde se esperava menos. A utilização do humor, do absurdo partiu de um partido «sisudo» o PS, de facto, estreou-se em grande, nos tempos de antena da TV para a Assembleia da República. Muito mais que os ataques directos ao PSD e ao PRD - ainda que interpretados pelo cidadão comum - terá resultados em cheio no recurso a métodos dignos de Herman José, para atingir tal fim. Os socialistas, com muito humor, bom gosto e sem recurso a meios sofisticados, como que transportaram «o tal canal» para o Largo do Rato, e terão garantido, logo à partida, uma audiência elevada para futuros tempos de antena. (…)”. No entanto, os dirigentes do PS recuaram e não houve mais devido à celeuma que foi provocada. No dia seguinte, o Correio da Manhã reproduzia um comentário do General Eanes que afirmou “Tenho pena pelo PS e pela liderança de Vítor Constâncio”. Na mesma edição era referido que Álvaro Cunhal, num comício, “considerou que «é de lastimar» que o PS conduza uma campanha «com tal violência»”…

(3). Acerca da maior cobertura dos média à publicidade negativa há um dado curioso, descrito num livro de Dennis Kavanagh (Election campaigning): a imprensa britânica e norte americana tem a tradição de apoiar uma das forças políticas nas eleições. Até meados da década de 60, a maioria dos jornais que optavam pelo apoio a um candidato davam maior cobertura a essa candidatura, com referências positivas. No final da década de 60 (depois do Watergate e da consequente desconfiança perante os políticos) a estratégia foi alterada. Há mais referências à candidatura adversária com mensagens negativas.

(4).“Estava previsto há meses: enquanto a oposição tentaria, com a abertura da campanha oficial, mostrar-se majestática, a situação daria início à sua última fase estratégica, a dramatização. Esta já é evidente. Cavaco Silva vem para a estrada. Sucedem-se as declarações sobre o caos que se vai abater sobre nós, no caso de o PSD não ganhar. A oposição não sabe fazer contas, iremos à falência. Os socialistas gastam dinheiro, a bancarrota é certa. Os investidores levam os capitais para o estrangeiro. Os trabalhadores perdem os empregos. Todos os grupos profissionais farão exigências irresponsáveis. (…)” Público - comentário de António Barreto. Setembro de 1995

12
Mai13

3. Os temas da mensagem

rgomes

Do ponto de vista do conteúdo, uma mensagem para ser eficaz, para conseguir persuadir, tem de reunir uma série de requisitos. Os fundamentais são: clareza, credibilidade e corresponder às expectativas das pessoas a quem essa mensagem se dirige.

«Schramm, Sears e Kappler sustentam que a comunicação aumenta o seu poder persuasivo se as preposições se apoiarem ou relacionarem-se com as necessidades do receptor e com os valores do grupo a que pertence. (…) A referência na comunicação persuasiva às necessidades insatisfeitas e a relação com a sua satisfação tem efeitos positivos inegáveis, sobretudo quando se referem ao gregarismo do individuo, à sua sociabilidade e à sua projecção nos demais e à integração no seu grupo de referência». – Mário Herreos Arconada (2)

Para atingir estes objectivos, recorre-se primeiramente às sondagens - qualitativas e quantitativas. Estes estudos visam conhecer o eleitorado e a perspectiva dos inquiridos em relação às várias organizações políticas.
São essencialmente quatro os parâmetros a compreender: procura-se descobrir os desejos dos votantes, a forma como o eleitorado avalia determinadas pessoas ou organizações, a expectativa que tem em relação a essas pessoas e qual o perfil ideal para o titular de determinado cargo político.

Em quase todas as eleições, antes da pré-campanha, os maiores partidos encomendam estas sondagens para aferir as mensagens que vão transmitir e definir as estratégias de ataque e defesa.

Segundo o estudo «Comportamento Eleitoral e Atitudes Políticas dos Portugueses» (1) (sobre as eleições legislativas de 2002) é relevante entender outros elementos, como por exemplo, se é habitual a transferência de votos entre blocos e os motivos que levam a esta mudança. Se há clivagens sociais ou culturais que são determinantes na escolha, se os elementos marcantes situam-se mais no plano ideológico ou nas imagens dos líderes , a percentagem de voto feminino. E até outros aspectos interessantes como por exemplo o que foi revelado sobre a expectativa económica: «os nossos resultados revelam que as avaliações dos portugueses se baseiam bem mais na evolução da economia num passado recente do que nas expectativas para o futuro. Ou seja, os eleitores portugueses são claramente retrospectivos». Sendo que, nas legislativas de 2002, «a seguir às avaliações dos candidatos e ao auto-posicionamento dos eleitores na escala esquerda-direita, a situação económica foi a terceira principal determinante do comportamento eleitoral».

É face a esta importância que a realização de sondagens é um instrumento fundamental para o exercício do poder e da actividade política.

«‘Gabinete Big Brother’ controla Governo
Morais Sarmento (…) admite reactivar também a estrutura que, no tempo de António Guterres, fazia estudos de opinião regulares sobre preferências detalhadas do eleitorado, por áreas temáticas, faixas etárias ou avaliações globais do Governo
».
Expresso 08/11/2003

Em primeiro lugar, estes estudos permitem identificar qual o eleitorado que será objecto das acções que vão ser desenvolvidas. É importante saber se as iniciativas vão ser desenvolvidas para um eleitorado generalizado ou segmentado.
Através destes estudos é definido o perfil de cada um dos segmentos, começando pelos que estão mais próximos da organização política – os militantes e simpatizantes.
Saliente-se, no entanto, que as sondagens são uma fotografia, um levantamento feito em determinado momento. As principais preocupações do eleitorado podem mudar.
Por isso mesmo, os partidos políticos realizam sempre várias sondagens. Por um lado, tentam para avaliar a evoluir das campanhas e perceber as mudanças de opinião . Por outro lado, é uma forma de se certificarem de que os estudos realizados são fiáveis.

- «Não encomendamos sondagens. As boas são muito caras» -Jorge Alves da Silva.
- «Na generalidade são fiáveis, mas cada uma sozinha não responde. Só vendo três, quatro, cinco se começam a perceber as tendências. Adorava ter instrumentos mais exactos» - Edson Athayde
- «O problema é que têm muito pouca segurança. Se estivéssemos num país onde a experiência política mostrasse uma real aproximação das sondagens, elas passariam a ser um instrumento importante»
- Vítor Dias.

Estas opiniões espelham a desconfiança em relação às sondagens, expressas ao Público de 5 de Julho de 1999 pelos responsáveis das campanhas do PP, PS e PCP.

Em alguns casos, além das sondagens realizadas internamente, as várias organizações políticas analisam em detalhe os estudos que são publicados na comunicação social.
Todos os partidos afirmam publicamente que não dão grande importância aos estudos de opinião, mas muitos deles gastam anualmente milhares de euros em sondagens.

É a partir dos resultados destes estudos de opinião que é feito um esboço da política de comunicação que se vai desenvolver. Os resultados são analisados em detalhe e é feito um trabalho meticuloso na definição da mensagem que se vai escolher.

Se o estudo incidir sobre uma decisão que vai ser anunciada, os resultados poderão indiciar qual a melhor forma para a apresentação dessa decisão: um exemplo – quando do anúncio da Reforma Fiscal, no governo de António Guterres, os estudos de opinião revelavam que o eleitorado valorizava significativamente duas ideias: o combate à fuga fiscal e uma maior justiça fiscal. Face a estes dados, na apresentação da medida o Governo salientou que a Reforma visava, entre outros, atingir dois objectivos essenciais: o combate à evasão fiscal e uma maior justiça fiscal. Através deste processo, seguramente, o Governo conseguiu uma melhor receptividade à sua proposta.
Em outros casos, como por exemplo em campanhas eleitorais, os estudos de opinião permitem ir mais além e esclarecer quais os temas que devem estar na agenda pública e de que forma devem ser abordados.

«Nunca, mas nunca mesmo, se esqueça: quem comanda sua campanha, o que você vai dizer ou fazer é sempre o eleitor, as necessidades concretas do eleitor. É triste, eu sei, você é um génio. Mas, o que se vai fazer? Há preços a pagar pela vitória» (3)

O ponto de partida é o que deseja o eleitorado. O que deseja em relação às suas preocupações e o que deseja em relação aquele a quem vai delegar essa responsabilidade.
«A política de imagem não procura propriamente que o público deseje ou considere valorosos a posição que se sustenta e/ou o actor que se apresenta, mas busca identificar o que o público já deseja e já considera valoroso para adequar a isso posição e actor. É quase como uma versão do princípio pirandelliano: a personagem, a personalidade ideal política em busca de um actor, a posição política ideal em busca de um autor» - Wilson Gomes

É a partir do estudo de todos estes elementos que se parte para a criação de uma marca, de uma ideia forte, de uma mais valia que distinga um líder (ou uma organização) em relação aos outros.

«Isto quer dizer: deve haver o mínimo de coerência, de coincidência a priori, entre a sua personalidade, sua história pessoal e política, suas atitudes de cidadão no passado, que darão credibilidade ao programa de obras e realizações que você defende agora. Você não muda diante do que descobriu sobre o eleitor. Você apenas adapta, acomoda seus objectivos e seu “discurso” à satisfação das necessidades do eleitor» (3)

É criar uma imagem. «Essa imagem consiste em ajustar personagens reais a perfis ideais e expectativas dos públicos. Não se trata, naturalmente, de criar uma imagem para um actor político, por exemplo, mas de adaptar o actor político a uma imagem ideal ou a uma imagem esperada.» - Wilson Gomes

«O conceito de “imagem de marca”, embora tenha por referência a imagem pública, pressupõe o preenchimento de condições específicas: a) que as regras e lógica de mercado tenham se estendido ao campo da política; b) que os media tenham reestruturado a esfera pública, constituindo-se o “ambiente natural” de exposição das “imagens políticas”; c) que os produtos “imagens públicas” sejam planeados e “produzidos” em sectores empresariais especializados, as agências de publicidade.
O “empreendimento” de produção de imagens marcas como forma de garantir longevidade para personalidades políticas é no entanto sempre problemático. A pretensão de “gestão científica” no âmbito das imagens políticas depara inevitavelmente com as ciladas do imponderável que podem implicar o sucesso, ou ao contrário a destruição de uma imagem marca.
(…)Vale ressaltar que as imagens marcas aprisionam os seus portadores em suas redes: eles devem permanentemente confirmá-las em gestos e acções
.» (4)

Michel Bongrand estabeleceu uma sistematização do que chama “eixos”, os elementos centrais da comunicação que vão reforçar os traços diferenciadores da imagem dos actores políticos, por exemplo, numa campanha eleitoral. Na linguagem do marketing político corresponderá ao «posicionamento» dos candidatos ou partidos para melhor atingirem os objectivos junto de determinado eleitorado.

cartaz da cdu nas legislativas de 99

Eixo ideológico: visa realçar uma diferença que à partida já é conhecida (esquerda/direita).
Tem grande efeito nas pessoas com uma intervenção política acentuada, ao contrário do que se passa com os indecisos.


Eixo político: projecta o futuro. O ponto de partida é o ambiente que se vive no eleitorado (continuidade, mudança, renovação, união).

Em 1991, o PSD projectou a mensagem de continuidade e conseguiu a segunda maioria absoluta.

cartaz do PSDcartaz do PSDEm 2002 o PSD apostou na mudança. «As sondagens qualitativas indicaram que o eleitor ainda estava de ‘ressaca’ das autárquicas (…) e um dos objectivos do PSD foi colar Ferro Rodrigues ao governo de António Guterres. E atacar nas políticas sociais. Os cartazes com as crianças tiveram esse fim»-Público, 22/03/2002

Sá CarneiroAntónio Guterres

Eixo pessoal: personalização. A sua utilização é frequente quando não há fortes traços distintivos entre os partidos concorrentes, quando o líder tem maior projecção do que a organização a que pertence ou quando existe uma grande proximidade entre os eleitos e os eleitores, como é o caso de eleições locais.

cartaz do PSD

Eixo temático: é circunstancial. Resulta dos estudos de opinião que indicam as principais preocupações do eleitorado e avalia o desempenho de quem exerce o poder no que se refere a estes problemas (saúde, educação, segurança…).

É a partir deste eixo, do traço que define a imagem do líder ou da organização política , que escolhem os temas principais e como irão ser apresentados.

Veja-se o exemplo da governação de Cavaco Silva, nas palavras (ao Expresso) de Fernando Lima, o seu principal assessor de imagem: “Era fundamental saber falar directamente para a opinião pública de uma governação que ele queria diferente, por contraposição ao executivo que o antecedera e que marcara um período de desagregação política e económica. (…) Acima de tudo, o que interessava era que o «Governo dos engenheiros», como foi apelidado pela Imprensa, mostrasse uma forte predisposição para fazer o que antes fora adiado.
A defesa da estabilidade política foi, praticamente, a palavra de ordem das legislativas de 1987, por considerar ser condição necessária para concretizar as grandes reformas estruturais e executar as obras públicas de que o País precisava para a sua modernização. Na campanha eleitoral de 1991, focou o seu discurso na exigência da consolidação da posição de Portugal na Europa Comunitária. A frase mais repetida foi: «Depois do avanço conseguido, não podemos resvalar pela montanha abaixo
».”

cavaco SilvaPara as eleições legislativas de 1987, a campanha do PSD centrava-se no líder e na “obra” feita no governo anterior. O panfleto que foi distribuído apontava quatro temas – crescimento económico, poder de compra, segurança social e juventude – e nas acções que foram desencadeadas, para concluir: “Portugal não pode parar”.

Para o conseguir, o partido que estava no poder tinha de reforçar o seu peso eleitoral, de modo a poder governar com estabilidade

Para se conseguir essa marca, esse sinal distintivo, quando da análise das sondagens é também avaliada de uma forma muito precisa o modo como o eleitorado caracteriza as organizações políticas concorrentes e os seus líderes.
Os elementos negativos dos adversários, revelados pelos estudos de opinião, são depois acentuados através de uma postura critica ou desencadeando iniciativas que possam fazer sobressair essa diferença.

cartazUma outra forma de sublinhar a ideia forte é transformá-la no slogan.
“A reacção não passará” – um dos slogans mais fortes depois da revolução dos cravos. Era utilizado essencialmente pelo PCP.

O slogan não ultrapassa uma frase, é conciso, simples, claro, de fácil memorização (tem poucas palavras e ideias), facilmente perceptível por qualquer pessoa e reflecte o desejo do eleitorado. Procura-se impacte e provocar de imediato uma reacção na audiência: de aprovação ou reprovação. A origem do slogan vem do grito de guerra dos clãs escoceses o «sluagh-ghairm».

Exemplos de slogans usados pelo PSOE em eleições gerais:
1977: Socialismo es Libertad
1979: Tu voto es nuestra fuerza
1982: Por el Cambio
1986: Por Buen Camino
1989: España en Progreso
1993: El Progresso de La Mayoria
1996: España en Positivo

«A Propaganda - Governo lança “Portugal em acção”
O Governo lançou um novo “slogan” numa altura em que está prestes a comemorar um ano: “Portugal em acção”. Todos os documentos divulgados pelos diferentes ministérios devem levar esta chancela para passar a mensagem de um governo dinâmico. A orientação vem do ministro da Presidência, Nuno Morais Sarmento
».
Público, 2003

Tendo em conta a importância destas escolhas, antes da decisão final é efectuado um teste, mais uma vez, através de estudos de opinião. É que nem sempre a escolha que parece mais evidente é a preferida do eleitorado. Em 1995 o PS teve várias opções e a que foi escolhida, depois do estudo de opinião (“Guterres – um homem que sabe o que quer para o país”) não era a favorita dos dirigentes do partido e não foi bem aceite pela comunicação social. Só que, reunia o agrado do elemento fundamental, o eleitorado

Santna LopesEm 2005, o PSD escolheu para a primeira fase da campanha o slogan «Contra ventos e marés». A frase foi criticada por alguma imprensa e por especialistas de marketing: «o slogan do PSD - “Contra ventos e marés” - apesar de enfatizar a capacidade de luta do líder, pode levar a segundas interpretações. “Não se sabe contra quem é; contra o Presidente, contra Marques Mendes ou contra Sócrates?”, explica João Quelhas», dirigente da Associação Portuguesa de Comunicação e Marketing Político (APCMP). DN, 3/2/2005. No entanto, segundo o secretário-geral do PSD, Miguel Relvas, a escolha da frase foi submetida a um estudo qualitativo e a maioria das opiniões preferiu este slogan. O próprio responsável pela campanha, Eihnhart Jácome da Paz, numa entrevista, salienta o mesmo factor. A mensagem não é para agradar aos especialistas. O relevante é que seja eficaz junto do eleitorado: «Não faço cartazes para ganhar prémios. Faço cartazes para os objectivos que o meu cliente necessite. No caso do nosso último cartaz, ‘Contra ventos e marés’, acho um cartaz graficamente muito bonito e muito superior a todos os outros.» Meios & Publicidade; edição nº 332 de 04/02/2005.

Como as principais organizações políticas recorrem a sondagens para fazer esta avaliação, por vezes, é fácil antecipar a política de comunicação da estrutura adversária - cada uma avançará com ataques aos pontos fracos da outra e salienta os aspectos positivos da sua candidatura, essencialmente nas matérias de maior interesse para o eleitorado.

Face a esta previsão, os partidos não perdem tempo no lançamento da ideia forte. Por vezes, quando pretendem ocupar um espaço político comum, alguns partidos apresentam uma mensagem muito semelhante. Em Portugal, nas legislativas de 1995, este tipo de situação provocou fortes críticas de plágio entre o PP e o PSD e levou mesmo os Populares a registarem previamente os slogans.

Um outro dado importante para não se perder tempo é que, se não for o próprio a criar uma mais valia, uma marca pela positiva, a oposição encarrega-se de lhe criar uma imagem associada a um ponto negativo. É o que sucede com frequência a quem se preocupa apenas com uma estratégia de comunicação quando está prestes a começar uma campanha eleitoral ou já se encontra numa situação de grande dificuldade.
«Na verdade, em Portugal, não há comunicação política. “Há, sim, comunicação eleitoral”, em termos de campanha. A excepção actual é Pedro Santana Lopes que, passada a vitória das eleições, manteve a mesma equipa de brasileiros a trabalhar-lhe a imagem». Visão; 13/11/2003

 

(1) Portugal a Votos; As eleições legislativas de 2002; Organização André Freire, Marina Costa Lobo e Pedro Magalhães; Imprensa de Ciências Sociais; Lisboa; 2004
(2) Mario Herreros Arconada; Teoria e técnica da Propaganda eleitoral; Coleccion Comunicación y relaciones públicas; PPU, Barcelona, 1989
(3) Como vencer eleições usando Tv e Rádio; Sérgio Arapuã de Andrade; Livraria Nobel; São Paulo; 1996
(4) Imagem Marca e Reeleição: A campanha presidencial de FHC em 1998; Rejane V. Accioly Carvalho

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4. Uma mensagem com identidade

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É a partir do eixo, da ideia central e dos temas a desenvolver, que a seguir se trabalha o conteúdo e a forma da mensagem que se quer transmitir.

A forma e o conteúdo das mensagens devem ser coerentes e ter uma identidade muito específica que resulta dos elementos distintivos em relação aos adversários, da ideia central que se quer transmitir e do eleitorado que se pretende atingir.

O propósito seguinte é dar corpo a essa identidade em todos os materiais, símbolos, linguagem, postura…Por exemplo, uma organização que dirija a sua mensagem para um eleitorado conservador recorre a uma postura institucional. A linguagem não é irreverente e os temas não põem em causa os valores tradicionais.

Se a mensagem é dirigida a um público jovem, não fará muito sentido o discurso institucional de Cavaco Silva usado em 1987: “Para ti, que és jovem, este postal breve mas importante. Quero dizer-te que só aceitei ser Primeiro-ministro para poder construir um presente digno de todos os Portugueses (…) casa própria, emprego, criação de novas empresas, formação profissional…”cartaz PSD

Veja-se agora um cartaz de Pedro Santana Lopes, nas autárquicas de 2001. A linguagem, a cor, as imagens tudo é diferente. O único ponto comum é o segmento do eleitorado que se quer atingir.

BE PresidenciaisNas presidenciais de 2001, Fernando Rosas também se dirigiu ao eleitorado mais jovem.

No entanto, tendo em conta as características da sua candidatura, apoiada pelo Bloco de Esquerda, pretendeu transmitir uma mensagem de irreverência e informalidade.

Um outro elemento determinante na aferição do tipo de mensagem é o ambiente político, o contexto em que se desencadeiam as iniciativas. Há, aliás, situações em que o contexto é de tal forma desfavorável que por melhor que seja a política de comunicação, já serve de muito pouco.

Num ambiente de continuidade não faz sentido apelar a rupturas, a mudanças fortes e usar uma linguagem muito hostil para quem está no poder.
Foi a ideia que o PCP tentou transmitir em 1986, um ano depois do primeiro governo liderado por Cavaco Silva. O ambiente não era propício à mudança. Bem pelo contrário, permitiu a primeira maioria absoluta na democracia portuguesa.

Num ambiente propício à manutenção de quem está no poder, quem se apresenta como alternativa segue outro caminho: “pode-se fazer melhor”, há áreas (os temas revelados pela sondagem) que estão em crise e, para ultrapassar esses problemas, são apresentadas medidas alternativas, uma outra postura perante os problemas…

Foi o que fez Marcelo Rebelo de Sousa enquanto líder do PSD. Porque não havia um ambiente propício à mudança – uma sondagem de Março de 1998 (Euroexpansão) revelava que 67% das pessoas criticavam a oposição aguerrida por parte dos sociais democratas -, o PSD apostava em temas que as sondagens mostravam como os pontos fracos da governação – saúde, justiça, droga e segurança.
O propósito era mostrar que “o PSD podia fazer melhor”; “o primeiro-ministro é simpático mas não governa”; “Comigo como primeiro-ministro a decisão sobre a greve dos médicos seria tomada em 24h” … É o que os políticos designam como «oposição construtiva».

A candidatura de Santana Lopes à Câmara de Lisboa em 2001 é um bom exemplo de uma campanha que conseguiu uma forte identidade e coerência.

Pedro Santana Lopes apresentava-se como um candidato com obra feita na Figueira da Foz, com ar jovial e com capacidade para «fazer de Lisboa uma capital europeia». A campanha foi em duas fases.

campanha de Pedro Santana LopesNa primeira, chamou a atenção para os elementos que as sondagens revelaram como negativos: o trânsito, a falta de habitação, os prédios em ruína… O grafismo era «pesado» e a ideia que provocava era de uma cidade ao abandono, uma «Lisboa parada». O objectivo era reforçar a ideia de que a situação era má e a mudança necessária.

santana lopes campanha lisboasantana lopes lisboa feliz










A segunda fase era a da «Lisboa Feliz».

O grafismo é jovem, as pessoas sorriem perante as propostas apresentadas. O próprio candidato apresentou-se de uma forma jovial, com cores alegres, em contraposição à primeira fase.

«Se a ‘oferta’ política dos grandes partidos hegemónicos é praticamente indiferenciada, a consequência lógica consiste em estabelecer algum tipo de discrepância tal como acontece nos mercados de livre concorrência, onde a publicidade se encarrega de difundir e dar notoriedade. Do mesmo modo, a propaganda eleitoral, cria diferenças não substanciais do ponto de vista político, mas reputadas como importantes pelo eleitorado»- Mario Herreros Arconada. (1)

 

(1) Teoria e técnica da Propaganda eleitoral; Coleccion Comunicación y relaciones públicas; PPU, Barcelona, 1989

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5. Uma mensagem credível

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Um outro elemento fundamental em qualquer processo de comunicação é a credibilidade.
Se ninguém acredita no que está a ser dito, a mensagem não tem qualquer efeito.
A falta de credibilidade pode radicar no emissor, na argumentação que está a ser utilizada, no próprio tema que serve de base à intervenção política ou, na falta de coerência de todos estes factores.
Algumas das decisões políticas que parecem «forçadas» ou «artificiais» têm a ver com este problema de falta de credibilidade. A tentativa de aliança PSD/PP em 1998 é um desses exemplos. Depois das sucessivas acusações mútuas entre o PP e o PSD e entre Marcelo e Portas, poucos acreditavam num fácil entendimento entre os dois partidos. Com a agravante de que um dos atributos críticos do líder do PSD era a falta de credibilidade. Numa sondagem da Metris, efectuada em Julho de 1997, eram tantas as pessoas que atribuíam a Marcelo Rebelo de Sousa a característica de honestidade como a de não honestidade. Cerca de um ano depois, em 9 de Abril de 1998, uma outra sondagem da Metris publicada no Independente voltava a colocar a credibilidade como um dos pontos mais fracos da prestação de Marcelo Rebelo de Sousa. Em honestidade, Marcelo tinha 8,4% e Guterres 42,1%.

Foi devido a esta «falta de credibilidade» que no dia em que Marcelo Rebelo de Sousa apresentou as bases programáticas da AD (22 de Janeiro de 1999), Carlos Magno fez o seguinte comentário na TSF: “as propostas podem ser interessantes. Resta é saber se as pessoas acreditam no que Marcelo prometeu”. Este indicador de falta de credibilidade de Marcelo Rebelo de Sousa foi também utilizado pelo PS como um dos instrumentos de combate ao PSD: “O que Marcelo diz hoje, amanhã não é verdade; não se pode confiar no que ele diz; sobre a mesma matéria, em menos de um mês o líder do PSD já disse três coisas diferentes…”

O mesmo problema se colocou quando da formação da AD em 2002. A questão da credibilidade não estava propriamente nos protagonistas – Durão Barroso e Paulo Portas – mas na solução encontrada. No dia em que a coligação foi dada como certa, quase todos os órgãos de comunicação social publicaram desavenças antigas entre os dois partidos. Até alguns dirigentes do PSD, como Pacheco Pereira, salientaram as dificuldades porque «nesta coligação há uma profunda desconfiança, em grande parte devido a Paulo Portas».

O mesmo Pacheco Pereira, posteriormente, foi uma das vozes que se juntou ao coro que chamava a atenção para o comportamento «errático» de Santana Lopes, quando Jorge Sampaio fazia auscultações sobre a decisão de avançar ou não para eleições antecipadas. Nesta fase, em Julho de 2004, várias pessoas (como por exemplo Marcelo Rebelo de Sousa) apontavam a Santana Lopes um perfil inadequado para chefiar o Governo porque é ‘«hiperdecisório» e «pouco coordenado» e, como tal, tende a ter «decisões múltiplas ao longo do tempo. Não é um perfil que (…) seja porventura o mais indicado para primeiro-ministro» É desta forma que Marcelo Rebelo de Sousa define o novo líder do PSD.’ (TSFOnline, http://www.tsf.pt/online/portugal/interior.asp?id_artigo=TSF151938)

Quando a falta de credibilidade é um dos atributos dominantes, é muito difícil ultrapassar este problema.

Em alguns casos, a credibilidade só lentamente é adquirida.
Os responsáveis políticos fazem um rigoroso controlo da exposição pública e procuram evitar qualquer sinal de desconfiança.
Recorrem a personalidades com grande credibilidade e reputação para “mostrar” como estão a ganhar o estatuto de “figuras respeitadas”. Em outros casos, repetem até à exaustão os argumentos indutores de confiança: “«O espírito de solidariedade já existe hoje entre os dois partidos, os dois líderes, as duas direcções e estou convencido que entre os dois partidos na sua generalidade. Acredito plenamente que isto vai funcionar», disse Durão”. – Público de 29/03/02 sobre a assinatura do acordo entre PSD e PP.

Em outras situações a credibilidade só pode ser conquistada assumindo-se os erros. Próprios ou cometidos por pessoas da mesma organização politica.
Foi o que fez Ferro Rodrigues quando se candidatou pelo PS em 2002. Perante a ideia generalizada de que o governo e o PS tinham cometido vários erros, Ferro Rodrigues assumiu o que foi feito de negativo e prometeu que com ele seria diferente: «Também cometemos erros. É nossa responsabilidade percebê-los e tirar as necessárias consequências, para corrigir caminhos e enfrentar as dificuldades com seriedade, com sentido de responsabilidade e sem indulgências connosco próprios» “RENOVAR A MAIORIA - O nosso compromisso com os portugueses” - Moção de Estratégia de Ferro Rodrigues para secretário geral do PS em 2002.

A credibilidade não é uma característica intrínseca a um indivíduo. É antes um processo contínuo, que se pode solidificar (mas nunca pode ser dado como irreversível) e, muitas vezes, é resultado de técnicas que criam essa aparência.

A mais recorrente é mostrar convicção no que se diz e ser consequente nas ilações: «Penso que, com inteira lucidez, devo reconhecer que, se nada fizesse e se olhasse para estas eleições e passasse por elas como porventura seria integralmente meu direito constitucional, continuando a exercer as funções de primeiro-ministro, o país cairia inevitavelmente num pântano político que minaria as relações de confiança entre governantes e governados, que são indispensáveis para que Portugal possa vencer os desafios que tem pela frente» (António Guterres em 16/12/01 ao anunciar a sua demissão de primeiro-ministro depois da derrota do PS nas eleições autárquicas).

Uma outra regra muito relevante para a afirmação da credibilidade é nunca violar os compromissos assumidos. Muito menos os que serviram de bandeira – “leia nos meus lábios” (George W. Bush sobre o aumento de impostos); “no jobs for the boys” (Guterres sobre a colocação de apoiantes em cargos públicos), “eu não fujo” (Durão Barroso nas eleições seguintes à demissão de António Guterres).

Quando um destes compromissos é desrespeitado, torna-se um poderoso instrumento de combate político a favor dos adversários.

É igualmente importante que se seja respeitado pelos que o rodeiam. Uma das imagens fortes de Cavaco Silva era o respeito que merecia de outros membros do governo e do PSD, o que contribuiu para solidificar a imagem de um líder forte.

O ritual desenvolvido por Cavaco Silva nas remodelações era um exemplo da afirmação dessa autoridade. Não remodelava sobre pressão da comunicação social e, quando o fazia, os visados eram demitidos sem «cerimónia».
José Sócrates foi elogiado por seguir a mesma postura. Remodelações de governo, negociações com parceiros e medidas impopulares foram sempre assumidas sem hesitação e sem receio da conflitualidade de interesses.
Ao contrário, na fase final da sua governação, a partir de 2000, a imagem de António Guterres foi afectada pelas divisões internas e pela afronta de alguns colegas de partido. A juntar a estas divisões, Guterres reforçou a sua imagem de hesitação e de falta de autoridade quando o Governo alterou as medidas sobre a interdição dos touros de morte Barrancos e o limite de álcool no sangue para os condutores de veículos.

Outro atributo a que se recorre com frequência para reforçar a credibilidade é o recurso a especialistas e a citações de estudos. Foi de certa forma o que se passou no dossier da co-incineração no governo de António Guterres. Como havia um problema de credibilidade – as pessoas não acreditavam nos argumentos do governo – recorreu-se a uma comissão de especialistas que serviu de juiz na selecção das cimenteiras onde se iria realizar a co-incineração. Através deste instrumento pretendia-se restabelecer a confiança das populações.

Um outro exemplo teve lugar nas legislativas de 2002. Muitas das medidas apresentadas pelo PSD tiveram o apoio de várias personalidades ligadas aos respectivos sectores: “Numa sala cheia de autoridades do PSD, o líder Durão Barroso apresentou ontem no Porto o programa económico reafirmando a intenção de fazer o choque fiscal que permitirá incrementar a produtividade e a competitividade da economia portuguesa.” Público 15/02/02. A presença destas personalidades era um sinal de credibilidade.

Para fortalecer a imagem de credibilidade um outro elemento importante é ter resposta fácil e directa para as questões que vão ser colocadas e evitar cair em contradição. Em momentos políticos importantes os dirigentes políticos são treinados para estas situações e os assessores preparam respostas que permitam atingir esse objectivo. O mesmo se passa em relação à comunicação não verbal.
Como a classe política vive permanentemente com o problema da falta de credibilidade, recorre quase diariamente a frases e situações que pretendem anular a desconfiança dos eleitores: a actividade que se desempenha não tem outro fim que não seja o bem comum (”Mais importante do que qualquer partido é Portugal. (…) Portugal pode contar comigo” - Durão Barroso em 15/03/02); uma visão fria e a realista (”O caminho que vos proponho não é um caminho fácil. Mas há um caminho” - Durão Barroso em 13/03/02); não se quer influenciar as ideias e os comportamentos dos outros (”Quando convidei o dr. Fernando Negrão, não lhe perguntei se era de esquerda ou de direita” - Durão Barroso em 01/03/02) .
Mais, em algumas situações, até se pode estar a ser prejudicado pessoalmente – a actividade profissional que desempenhava dava mais rendimentos e menos chatices; tem provas dadas na actividade profissional e não precisa da política para conseguir seja o que for; o estatuto de figura pública só provoca constrangimentos, já teve convites aliciantes mas continua empenhado no cargo – foi o caso de António Guterres quando foi «sondado» para Presidente da Comissão Europeia: os dirigentes do PS não se cansaram de repetir que o primeiro-ministro preferiu permanecer no cargo.

No que se refere à argumentação, os problemas mais frequentes que podem por em causa a credibilidade têm a ver com contradições. Contradições relativamente a posições assumidas no passado; contradições entre o prometido e o que está a ser feito; e contradições com os valores dominantes.
A citação de posições assumidas pelo adversário no passado e que não correspondem às actuais é um dos recursos mais frequentes em política e é sempre de esperar na prática jornalística.
Em todos os partidos há gabinetes de imprensa que recolhem e arquivam informação para que, a qualquer momento, esse material possa ser usado no combate político.

No que se refere a posições que colidem com os valores dominantes de uma determinada audiência, há quem utilize a seguinte estratégia: não iniciar a intervenção com argumentos radicais, mas antes criticar com moderação esses axiomas e, lentamente ir chamando a atenção para as diferenças de pontos de vista.
Por exemplo, no referendo sobre o aborto era frequente os vários intervenientes (contra e a favor da despenalização) iniciarem as intervenções com as palavras «este é um problema complexo»; «a decisão é muito íntima»; «do ponto de vista ético não é fácil…». Tentavam começar de uma forma abrangente, com um argumento consensual, o que permitia uma melhor receptividade por parte da audiência.

«Quando a comunicação se faz num pequeno círculo, dados pessoais tornam-se mais relevantes para acentuar ou reduzir a credibilidade do emissor da mensagem. Torna-se importante, então, a naturalidade, a identificação do líder com o meio. (…) Porque são pessoas reunidas em um pequeno círculo, têm alguma coisa em comum. Então, antes de falar, o comunicador deve ouvir. Ouvir e descobrir este traço comum. Quais as aspirações, os problemas. Ambientado, conhecendo o seu palco, o comunicador será mais eficiente. (…) Terá naturalidade e saberá transmitir a sua mensagem no código adequado» - Eduardo Portella Netto

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6.Uma mensagem simples

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Como a comunicação política se dirige a uma audiência muito vasta, a mensagem é simples, concisa e perceptível por todos.
Este não é o tipo de comunicação onde são feitas análises profundas.

Uma preocupação constante do prof. Cavaco Silva era que o seu discurso fosse facilmente assimilado pelos portugueses. Para ele era fundamental que as pessoas identificassem os objectivos da sua governação. Por isso, era o mais simples e directo possível. Procurava sempre converter em palavras correntes o jargão habitual das questões complexas.” - Fernando Lima (1)

Há excepções mas a grande maioria dos dirigentes políticos aprenderam que é essencial saber qual o público que vão atingir. É um dos trabalhos das assessorias. Fazer um levantamento de qual a audiência de um programa de televisão ou rádio. Qual a audiência de uma publicação. É tendo em conta esta aprendizagem que os principais responsáveis políticos sabem que uma mensagem para o “grande público” não é a mesma coisa que para um público especializado. Se uma medida for revelada no noticiário das 20h de uma das televisões, o discurso é o mais simples possível, mesmo correndo o risco de ser simplista. Se, por outro lado, a medida é divulgada numa revista da especialidade, já produzem um discurso mais técnico, mais elaborado e com pormenores.

Há também várias figuras de estilo a que os políticos recorrem com frequência para conseguirem uma mensagem simples e directa. Uma das figuras mais utilizadas é a metáfora.

cartaz de apoio a candidatura de Ramalho Eanes Se for bem utilizada, a metáfora ganha um sentido que vai muito para além das palavras. Foi o caso do apoio do PPD à candidatura de Ramalho Eanes à Presidência da República em 1976.

A audiência percepciona de uma forma mais precisa a mensagem que se transmite. Se for eficiente, não é preciso dizer mais nada. Está lá todo o sentido que se pretende dar.
Tem ainda uma outra vantagem: é facilmente mediatizada porque a metáfora é do agrado do discurso dos media. Um exemplo: a cobertura noticiosa da campanha do PSD no referendo da regionalização. No Domingo, 1 de Novembro de 1998, o DN dava o seguinte título à reportagem sobre as iniciativas de Marcelo Rebelo de Sousa: “Piquenicão «laranja» na Beira de Guterres”. No dia seguinte “Portugueses não são cobaias”. Na terça-feira, o lead da reportagem era: “Na cartilha do PSD, a regionalização - «um tiro no escuro, um cheque em branco» - tem muitos males”. Na quarta-feira o título era: “Uma bomba atómica no sistema partidário”.

Muitas vezes estas frases são fruto da imaginação do emissor. Mas nem sempre. Por vezes são resultado do trabalho de assessorias. Procuram uma expressão que tenha força, imaginação, simples e curta. Ou seja, funciona como um sound bite. Este é o «ponto forte de Paulo Portas, a capacidade de sintetizar rapidamente frases mediáticas para determinadas coisas e parecer sério», nas palavras de Einhart da Paz, que assessorou Durão Barroso e Santana Lopes. (2)

Os jornalistas gostam deste efeito porque têm o trabalho facilitado: é só pegar no que é emitido pela boca do político e colocá-lo no precioso segundo televisivo, ou no imaginativo jogo de palavras do título de jornal. É um estilo que se presta à frase assassina, à boutade, ao jogo de palavras” – Pacheco Pereira. (3)

Em alguns casos são os próprios jornalistas que alteram o sentido da expressão e transformam-na num sound bite.

Há outros processos simples e eficazes e do gosto dos jornalistas. Se a medida que vai ser anunciada implica um investimento significativo, este é um dado que os políticos dão grande relevo nos discursos e na pasta de imprensa que é entregue aos jornalistas.
O mesmo se passa com o número de pessoas abrangidas, que estão envolvidas na operação, a contabilização do sucesso alcançado….
Os jornalistas gostam muito deste género de números e com muita frequência dão-lhes largo destaque. Por vezes até anulam o efeito pretendido pelo emissor.

Quando do primeiro governo de António Guterres uma das medidas foi construir 12 novos centros de atendimento a toxicodependentes. Foi este o título da notícia na quase totalidade dos jornais, rádios e televisões quando do anúncio da medida. Mas, nas iniciativas seguintes, porque este dado constava no dossier de imprensa, era quase sempre o elemento relevante das notícias mesmo quando o acontecimento incidia numa outra questão. A partir daqui, em iniciativas sem grande impacte, referia-se este número e, em muitos casos, o elemento central das notícias era, mais uma vez, os 12 centros de atendimento.
Outro exemplo, mas prejudicial para a política de comunicação do governo de Guterres: quando a oposição (essencialmente o PCP) queria destacar a violação da promessa do «no job for the boys», referia o número total de nomeações realizadas. Por mais que o governo tentasse justificar e negar a acusação, raramente conseguia esse objectivo. O número era «fatal».

 

(1) No mesmo texto é referido um outro exemplo pelo jornalista Carlos Magno: “Interessa menos saber quem escrevia os discursos de Cavaco do que perceber porque é que ele fazia discursos assim. Simples e directos. Muitas vezes irritantes para as elites, mas eficazes no eleitorado que ele pretendia atingir. E com quem estabelecia cumplicidades. Ao discursar em Vila Real, depois de o seu governo minoritário ter caído na AR, Cavaco perguntou: «Se estávamos a governar bem, porque é que nos derrubaram?» Uma senhora da primeira fila do comício sugeriu: «Foi por inveja, senhor Professor». Cavaco, que até então tinha repetido a mesma pergunta em todo o lado, chegou ao comício da Régua e incorporou a resposta da militante anónima no seu discurso dizendo: «Só por inveja nos podem ter derrubado…»”.
(2) Independente; 22/03/2002
(3) Pacheco Pereira em Diário de Notícias, 1 Abril de 1999.

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Mai13

7. Uma mensagem fixa e repetida

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Para se conseguir uma mensagem com identidade, simples e eficaz, um outro factor essencial é concentrar o “discurso” nos temas chave e não sair daqui. De nada vale a abordagem de outros temas que não encontram correspondência no eleitorado.

A dispersão tem como consequência andar ao sabor da corrente. É um sinal de falta de convicção e corre-se o risco de cair nos temas que a força política adversária mais deseja. Só se perde tempo, dinheiro e credibilidade - três factores fundamentais em qualquer processo de comunicação política.

A falta de um rumo foi uma das críticas feitas ao governo de António Guterres. Nas palavras de Manuel Maria Carrilho, «umas vezes a prioridade era a educação, outras vezes era a saúde e até foi o Euro 2004».

Um outro exemplo teve lugar na campanha eleitoral das legislativas de 2002. O presidente da Câmara do Porto entrou em conflito com o FC Porto e causou um sério embaraço ao PSD. Segundo o responsável pelo marketing dos sociais-democratas, foi o que correu pior na campanha. «Não porque Rui Rio estivesse certo ou errado. Mas o momento não era o adequado. Durante uma semana, em vez de se discutirem propostas de governo ou criticar o governo PS, só se falou de um assunto que não tinha o mínimo interesse para o eleitor decidir o voto». Esta declaração foi feita numa entrevista ao Independente. Noutra entrevista, ao Público, Einhart da Paz revelou que este caso fez o PSD perder votos.


Mais recentemente e para evitar este efeito de dispersão, as “máquinas partidárias” distribuem diariamente aos principais dirigentes qual o tema que vai ser abordado e quais são os argumentos.


Para se optimizar os efeitos pretendidos e para se marcar a agenda dos media e a agenda pública - o que as pessoas falam no seu quotidiano - é insuficiente expor a mensagem apenas uma vez. Através de uma única iniciativa, nem sempre se consegue o contacto com o eleitorado.


A repetição da mensagem aumenta a probabilidade de se atingir o eleitorado pretendido. Os receptores entendem melhor a mensagem que se pretende transmitir e favorece a memorização.

Vários estudos confirmam esta tese. Uma mensagem transmitida apenas uma vez num órgão de comunicação social tem um efeito praticamente nulo. Segundo esses estudos, num período curto, a mensagem para ter algum efeito, terá de ser repetida pelo menos três ou quatro vezes.

Quanto maior é a exposição, mais fácil é a receptividade da audiência; e em muitos casos os valores, as ideias associadas a essas mensagens, acabam por nortear o nosso comportamento e a avaliação que fazemos do mundo que nos rodeia.

Repetir não significa que seja sempre com o mesmo formato.

«Os anunciantes tentam eliminar o desgaste utilizando uma técnica conhecida como “repetição com variações”. Mediante esta técnica, repete-se muitas vezes a mesma informação ou tema, mas variando o formato da apresentação» - Anthony Pratkanis e Elliot Aronson.


Um exemplo de como se pode provocar o efeito repetitivo utilizando instrumentos diferentes teve lugar na campanha para as eleições legislativas de 2002. Em várias situações Durão Barroso deu a entender que pretendia uma maioria absoluta para o PSD, mas nunca o disse abertamente. A primeira referência foi feita no dia 07/03/02 num comício em Vila Real: “Portugal precisa absolutamente de uma maioria, Portugal precisa de uma maioria absoluta do PSD (…)Aquilo que está em causa em 17 de Março é saber se o governo deve ser de quatro meses ou de quatro anos”.

Durão BarrosoNa mesma altura em que Durão Barroso iniciou o apelo à maioria absoluta para assegurar a estabilidade, chegava à caixa do correio dos eleitores um e-mail a reforçar a mesma mensagem e até com a mesma palavra, «estabilidade».

Durão Barroso não parou no apelo à maioria absoluta. Se no dia 7 fez a primeira referência, no dia seguinte, em Barcelos, defendeu «um governo estável para restituir a esperança». No dia 9, no Porto, falou da «caminhada para a maioria». No comício do dia 10 em Aveiro voltou à expressão «só um Governo estável e forte…».

Sublinhe-se, no entanto, que há uma alteração na linguagem. Enquanto no dia 7, em Vila Real, Durão Barroso utiliza a expressão «uma maioria absoluta do PSD», nos dias seguintes o apelo vai no mesmo sentido mas não utiliza a expressão «maioria absoluta». A razão pode ser encontrada numa entrevista ao Público de 22/03/2002 de Einhart Jácome da Paz. O responsável pelo marketing político do PSD refere que este foi um dos momentos em que «os sociais-democratas perderam votos porque, na altura em que Durão pede a maioria absoluta assustou muitos eleitores». Numa outra entrevista, publicada no mesmo dia, no Independente, Einhart, interrogado «se foi um erro o PSD pedir maioria absoluta muito cedo?», respondeu: «Isso não foi uma questão estratégica de marketing, foi uma estratégia política».


Já no cargo de primeiro-ministro, há um outro exemplo de como Durão Barroso, através da repetição da mensagem, tentou generalizar uma ideia: a da retoma económica que estava a chegar.

O ponto de partida foi a passagem do ano, de 2003 para 2004. Este período, para muitos, constitui uma época de viragem: «ano novo, vida nova». Os rituais da passagem do ano, com os votos de «feliz e próspero ano novo» são outros sinais de alguma receptividade das pessoas para a mudança. Assim, em 25 de Dezembro, na mensagem de Natal, Durão Barroso centrou a sua intervenção na ideia «o pior já passou, pelo que o novo ano já será melhor». No dia 30 foi visitar a AutoEuropa e repetiu a mensagem: «o pior já passou» e «2004 será o ano da retoma económica». No dia 5 de Janeiro, o PSD fez um tempo de antena onde o tema e a expressão utilizada foram idênticos: «2004 será um ano de recuperação». No dia seguinte, Durão Barroso comentou o relatório do Banco de Portugal e afirmou que o documento confirma que «o ponto mais baixo do ciclo económico já terá passado e os primeiros sinais de retoma estão à vista». Este comentário foi feito quando recebeu em S. Bento dois grupos que foram cantar as Janeiras ao primeiro-ministro. No dia seguinte, em 7 de Janeiro, Durão Barroso recebeu o Governador do Banco de Portugal para analisar a perspectiva da economia portuguesa. No dia 8, o ministro Marques Mendes foi ao Parlamento fazer um discurso onde, segundo a agência Lusa, «elegeu a recuperação económica como a grande meta para 2004. Acabou a recessão. Iniciou-se a retoma e a recuperação’». Saliente-se que nestes dias, de 25 de Dezembro a 8 de Janeiro, o Governo optou por não insistir em veicular qualquer outra mensagem.


Apesar do esforço, a repetição desta mensagem acabou por, nesta altura, ser um fracasso. É que foi seguida de algumas medidas em sentido contrário. No início de 2004 foram anunciados aumentos acima da inflação de alguns produtos e serviços básicos, o preço dos combustíveis teve uma subida assinalável e, pelo segundo ano consecutivo, foram congelados os aumentos salariais da Administração Pública. Para o cidadão comum (e para os sindicatos e algumas organizações políticas) estas medidas eram contraditórias com a mensagem que o governo insistia em transmitir.


O efeito repetitivo nem sempre é do agrado da comunicação social. Nas Legislativas de 2005 foram vários os jornalistas que fizeram uma abordagem negativa da campanha do PS pelo facto de José Sócrates não alterar os elementos centrais do seu discurso. Em termos de ‘graça’ chegavam a compará-lo a um robot.

«Sobe:
Tudo sobre rodas. A campanha do PS funciona - passe a banalidade - como um relógio suíço. Recintos cheios, nenhum discurso fora dos eixos, tudo rigorosamente controlado. A “máquina” guterrista - com Jorge Coelho ao leme - ainda é o que era. Pelo menos por enquanto.
Desce:
A “perfeição” da campanha do PS tem um reverso: o tédio. OS estrategos parecem apostados numa campanha de risco absolutamente mínimo, ou seja, desprovida, em absoluto, de factos noticiosos. Não se passa nada porque a estratégia é precisamente essa. Torna-se difícil citar José Sócrates porque o líder resiste fortemente ao apelo de dizer o que quer que seja de novo
». João Pedro Henriques; Público; 07/02/05

Nos últimos dias, num encontro informal, Sócrates explicou aos jornalistas que tinha um manual de Blair onde um dos conselhos era não alterar o discurso: «repeat and remind».


Ver ainda: Pequenos/grandes erros

12
Mai13

8. Quem marca a actualidade

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O objectivo em qualquer processo de comunicação é conseguir atingir o público-alvo com uma mensagem que obtenha uma receptividade positiva.
Como este é um objectivo que todas as organizações políticas, sociais, económicas…, grupos de pressão e cidadãos anónimos pretendem alcançar, há um “mercado” - a agenda mediática - que é fortemente competitivo. Há sempre alguém a querer marcar a agenda do dia com uma questão/tema e uma perspectiva egoísta sobre essa matéria.


Se uma organização política, ou qualquer outra instituição, não está preparada e organizada para marcar essa agenda, acaba por ver os pressrelease no lixo e é confrontada com temas que não lhe interessa discutir e que são lançados por outras forças políticas.

Dick Cheney, vice-presidente de G. W. Bush e que esteve na Casa Branca, como Chefe de Gabinete de Gerald Ford e Secretário de Estado da Defesa na administração George Bush, numa entrevista a John Antonhy Maltese (1) é bem claro: “não deixe a imprensa marcar a agenda. É o que pretendem. Eles gostam de marcar a agenda. Eles gostam de decidir o que é importante. Se os deixa fazer isso, eles estragam a sua presidência. (…) O objectivo é marcar a agenda pública, ter a certeza que todas as estruturas da Casa Branca (…) estão de acordo com a agenda e depois, promover com agressividade essa agenda no mercado da comunicação social. Sondagens qualitativas e quantitativas permitem limar as mensagens presidenciais; frases chave são escritas em pronunciamentos públicos do Presidente; as exposições públicas são coreografadas para que a mensagem seja reforçada pelas imagens visuais e o dia a dia é controlado para evitar mensagens contraditórias”.


Na administração Reagan, um outro funcionário da Casa Branca, com responsabilidades na política de comunicação, chamou a atenção para o mesmo objectivo com um estudo interessante. David Gergen fez um levantamento dos primeiros cem dias de cada administração desde os tempos de Franklin Roosevelt. A conclusão a que chegou foi: os presidentes que obtiveram sucesso foram os que estabeleceram de imediato uma agenda clara e simples (1).


No que se refere à experiência portuguesa, são igualmente esclarecedoras as palavras de Fernando Lima, no já citado depoimento ao Expresso: “Com a crescente importância que a informação tem sabido, ultimamente, reivindicar para ela própria, tem-se cada vez mais a impressão de que o destino de um governo não está nas mãos de quem o dirige mas, sim, dos «media» que são ou não generosos no tratamento que lhes dá.”


Nos governos de Cavaco Silva, António Guterres , Durão Barroso e Santana Lopes todas as semanas havia uma reunião de assessores de imprensa onde era planificada a política de comunicação de todo o executivo (o governo de José Sócrates rompeu com este procedimento para evitar fugas de informação, segundo relatou o Expresso em 23/07/2006). Por vezes, para evitar sobreposições era alterada a agenda de algumas iniciativas.

Noutros casos, por exemplo quando a agenda da semana era marcada por um determinado tema, eram solicitadas iniciativas a alguns ministérios ou dada a orientação sobre o discurso a produzir que tinha de estar associado, de forma positiva, ao tema dessa semana.


A importância da marcação da agenda baseia-se no seguinte pressuposto: parte significativa do conhecimento de um indivíduo é obtido através da comunicação social (agenda dos media). Muito do que as pessoas falam e comentam no seu quotidiano (agenda pública) tem como referência o que foi transmitido pelos media. Muitas das preocupações de um indivíduo e da comunidade onde se insere, são resultado das notícias que lhes chegam.

É por este motivo que os governos, partidos políticos, grupos de pressão… tentam, por um lado, determinar o conteúdo e a forma dos temas que querem publicitar e, por outro lado, evitar que sejam os opositores, através da comunicação social, a acentuarem matérias que são negativas.


De certa forma, este é também um processo de construção/desconstrução de imagem pública de instituições e dirigentes políticos.

Ao condicionar a agenda dos media – o conteúdo e a forma da mensagem que chega aos eleitores – um político está a fazer a gestão da sua imagem e a tentar fazer com que o adversário político perca o controlo da sua imagem.

Como este é um processo que nunca tem fim, (nenhuma impressão, nenhuma imagem pública é fixa), os vários agentes políticos (e não só) estão permanentemente a criar factos políticos para tentarem condicionar a agenda dos media.

«A multiplicação e a difusão dos media modernos modificaram profundamente o modo de produção das imagens políticas. Podem ser fabricadas em grande número, por ocasião de acontecimentos ou circunstâncias que não têm necessariamente um carácter excepcional. (…) tornando-se diárias; quer dizer que elas se vulgarizam e se usam, o que obriga a frequentes renovações ou à criação de aparências de novidade.»- Georges Balandier


A regra para a marcação da agenda não é muito complicada: o principal critério do jornalista tem a ver com a importância que o tema (o conteúdo ou a forma) provoca na audiência do meio de comunicação onde trabalha. Para o jornalista, o que é importante é o que ele pensa que pode despertar interesse nas pessoas a quem se dirige, os consumidores da informação que vai relatar.


Sendo assim, para se conseguir a atenção dos jornalistas as iniciativas incidem, preferencialmente, em temas que garantem a actualidade, que interessem às audiências dos meios de comunicação social. Não só através dos temas dessas iniciativas mas, essencialmente, através da forma como eles são apresentados. Por outras palavras, procura-se despertar a atenção dos jornalistas, já que, todos os dias, eles andam numa procura incessante de notícias.


Nos casos em que não se está preparado para marcar essa agenda, o resultado pode ser o esquecimento ou a quase ignorância do público relativamente às actividades que se desenvolvem.

Veja-se o exemplo dos parlamentos:
É um dado generalizado em praticamente toda a Europa, que “na maior parte dos casos, o espaço que os media dedicam às actividades dos parlamentos, não é de natureza a provocar a atenção.” (Relatório do Parlamento Europeu sobre parlamentos e media - 12 Setembro de 1997).

Não é de estranhar. A principal atenção dos media não recai no carácter público das decisões que são tomadas no Parlamento. O interesse é conseguido pela forma como são tomadas essas decisões - o drama de uma votação; uma gaffe; um “combate na arena entre dois gladiadores”; um fait divers… Ou seja, o que é espectáculo.

Na história recente do parlamento português há deputados que são especialistas no aproveitamento deste tipo de situações.
Quando num momento político importante o debate não está a correr bem é frequente alguns deputados tentarem criar um incidente ou aproveitarem um lapso para “despistar” a comunicação social.
Muitas vezes este objectivo é conseguido. A comunicação social coloca o debate no esquecimento e concentra a atenção na troca de palavras azedas entre dois deputados, na indignação de uma bancada, que fez vários protestos e até ameaçou abandonar o hemiciclo. Em alguns casos, quando se pretende dar maior dramatismo, algumas bancadas até chegam a pedir a interrupção dos trabalhos para dar uma conferência de imprensa.


Quando a encenação é bem feita – drama, agressividade, ridículo…- raros são os jornalistas que não se deixam ir na teatralização. É até quando as notícias do parlamento têm maior destaque.


Quando António Guterres foi líder do Grupo Parlamentar do PS, uma das confissões que fez a alguns jornalistas era que, nos debates mais relevantes, preparava sempre uma iniciativa que desencadeava a meio da tarde. Com isso pretendia chamar a atenção dos media e tentar que o assunto pudesse ser tratado pelos repórteres de televisão, de modo a assegurar a sua transmissão nos telejornais do ‘espaço nobre’.


Ainda no que se refere aos parlamentos, devido à cobertura informativa, há uma outra alteração de comportamento dos deputados que passa despercebida mas onde alguns são peritos. É ir «à boleia» do protagonista. Se um determinado deputado vai falar, se a sua intervenção está agendada e é considerada relevante, é frequente colegas de bancada sentarem-se ao lado. Conseguem-se vários objectivos. Primeiro, quem se senta ao lado tem a possibilidade de aparecer nas televisões e nas fotos da imprensa, ganhando assim visibilidade. Para alguns, estes segundos são os únicos momentos de «fama».
Por outro lado, consegue-se enfatizar uma imagem de importância porque o que está a ser dito é acompanhado com toda a atenção pelos colegas.

Por último, como os deputados vão dando sinais de concordância com gestos ou expressões orais, a intervenção ganha mais convicção.

 

(1). Spin Control