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Comunicação Política

Comunicação Política

12
Mai13

8. Quem marca a actualidade

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O objectivo em qualquer processo de comunicação é conseguir atingir o público-alvo com uma mensagem que obtenha uma receptividade positiva.
Como este é um objectivo que todas as organizações políticas, sociais, económicas…, grupos de pressão e cidadãos anónimos pretendem alcançar, há um “mercado” - a agenda mediática - que é fortemente competitivo. Há sempre alguém a querer marcar a agenda do dia com uma questão/tema e uma perspectiva egoísta sobre essa matéria.


Se uma organização política, ou qualquer outra instituição, não está preparada e organizada para marcar essa agenda, acaba por ver os pressrelease no lixo e é confrontada com temas que não lhe interessa discutir e que são lançados por outras forças políticas.

Dick Cheney, vice-presidente de G. W. Bush e que esteve na Casa Branca, como Chefe de Gabinete de Gerald Ford e Secretário de Estado da Defesa na administração George Bush, numa entrevista a John Antonhy Maltese (1) é bem claro: “não deixe a imprensa marcar a agenda. É o que pretendem. Eles gostam de marcar a agenda. Eles gostam de decidir o que é importante. Se os deixa fazer isso, eles estragam a sua presidência. (…) O objectivo é marcar a agenda pública, ter a certeza que todas as estruturas da Casa Branca (…) estão de acordo com a agenda e depois, promover com agressividade essa agenda no mercado da comunicação social. Sondagens qualitativas e quantitativas permitem limar as mensagens presidenciais; frases chave são escritas em pronunciamentos públicos do Presidente; as exposições públicas são coreografadas para que a mensagem seja reforçada pelas imagens visuais e o dia a dia é controlado para evitar mensagens contraditórias”.


Na administração Reagan, um outro funcionário da Casa Branca, com responsabilidades na política de comunicação, chamou a atenção para o mesmo objectivo com um estudo interessante. David Gergen fez um levantamento dos primeiros cem dias de cada administração desde os tempos de Franklin Roosevelt. A conclusão a que chegou foi: os presidentes que obtiveram sucesso foram os que estabeleceram de imediato uma agenda clara e simples (1).


No que se refere à experiência portuguesa, são igualmente esclarecedoras as palavras de Fernando Lima, no já citado depoimento ao Expresso: “Com a crescente importância que a informação tem sabido, ultimamente, reivindicar para ela própria, tem-se cada vez mais a impressão de que o destino de um governo não está nas mãos de quem o dirige mas, sim, dos «media» que são ou não generosos no tratamento que lhes dá.”


Nos governos de Cavaco Silva, António Guterres , Durão Barroso e Santana Lopes todas as semanas havia uma reunião de assessores de imprensa onde era planificada a política de comunicação de todo o executivo (o governo de José Sócrates rompeu com este procedimento para evitar fugas de informação, segundo relatou o Expresso em 23/07/2006). Por vezes, para evitar sobreposições era alterada a agenda de algumas iniciativas.

Noutros casos, por exemplo quando a agenda da semana era marcada por um determinado tema, eram solicitadas iniciativas a alguns ministérios ou dada a orientação sobre o discurso a produzir que tinha de estar associado, de forma positiva, ao tema dessa semana.


A importância da marcação da agenda baseia-se no seguinte pressuposto: parte significativa do conhecimento de um indivíduo é obtido através da comunicação social (agenda dos media). Muito do que as pessoas falam e comentam no seu quotidiano (agenda pública) tem como referência o que foi transmitido pelos media. Muitas das preocupações de um indivíduo e da comunidade onde se insere, são resultado das notícias que lhes chegam.

É por este motivo que os governos, partidos políticos, grupos de pressão… tentam, por um lado, determinar o conteúdo e a forma dos temas que querem publicitar e, por outro lado, evitar que sejam os opositores, através da comunicação social, a acentuarem matérias que são negativas.


De certa forma, este é também um processo de construção/desconstrução de imagem pública de instituições e dirigentes políticos.

Ao condicionar a agenda dos media – o conteúdo e a forma da mensagem que chega aos eleitores – um político está a fazer a gestão da sua imagem e a tentar fazer com que o adversário político perca o controlo da sua imagem.

Como este é um processo que nunca tem fim, (nenhuma impressão, nenhuma imagem pública é fixa), os vários agentes políticos (e não só) estão permanentemente a criar factos políticos para tentarem condicionar a agenda dos media.

«A multiplicação e a difusão dos media modernos modificaram profundamente o modo de produção das imagens políticas. Podem ser fabricadas em grande número, por ocasião de acontecimentos ou circunstâncias que não têm necessariamente um carácter excepcional. (…) tornando-se diárias; quer dizer que elas se vulgarizam e se usam, o que obriga a frequentes renovações ou à criação de aparências de novidade.»- Georges Balandier


A regra para a marcação da agenda não é muito complicada: o principal critério do jornalista tem a ver com a importância que o tema (o conteúdo ou a forma) provoca na audiência do meio de comunicação onde trabalha. Para o jornalista, o que é importante é o que ele pensa que pode despertar interesse nas pessoas a quem se dirige, os consumidores da informação que vai relatar.


Sendo assim, para se conseguir a atenção dos jornalistas as iniciativas incidem, preferencialmente, em temas que garantem a actualidade, que interessem às audiências dos meios de comunicação social. Não só através dos temas dessas iniciativas mas, essencialmente, através da forma como eles são apresentados. Por outras palavras, procura-se despertar a atenção dos jornalistas, já que, todos os dias, eles andam numa procura incessante de notícias.


Nos casos em que não se está preparado para marcar essa agenda, o resultado pode ser o esquecimento ou a quase ignorância do público relativamente às actividades que se desenvolvem.

Veja-se o exemplo dos parlamentos:
É um dado generalizado em praticamente toda a Europa, que “na maior parte dos casos, o espaço que os media dedicam às actividades dos parlamentos, não é de natureza a provocar a atenção.” (Relatório do Parlamento Europeu sobre parlamentos e media - 12 Setembro de 1997).

Não é de estranhar. A principal atenção dos media não recai no carácter público das decisões que são tomadas no Parlamento. O interesse é conseguido pela forma como são tomadas essas decisões - o drama de uma votação; uma gaffe; um “combate na arena entre dois gladiadores”; um fait divers… Ou seja, o que é espectáculo.

Na história recente do parlamento português há deputados que são especialistas no aproveitamento deste tipo de situações.
Quando num momento político importante o debate não está a correr bem é frequente alguns deputados tentarem criar um incidente ou aproveitarem um lapso para “despistar” a comunicação social.
Muitas vezes este objectivo é conseguido. A comunicação social coloca o debate no esquecimento e concentra a atenção na troca de palavras azedas entre dois deputados, na indignação de uma bancada, que fez vários protestos e até ameaçou abandonar o hemiciclo. Em alguns casos, quando se pretende dar maior dramatismo, algumas bancadas até chegam a pedir a interrupção dos trabalhos para dar uma conferência de imprensa.


Quando a encenação é bem feita – drama, agressividade, ridículo…- raros são os jornalistas que não se deixam ir na teatralização. É até quando as notícias do parlamento têm maior destaque.


Quando António Guterres foi líder do Grupo Parlamentar do PS, uma das confissões que fez a alguns jornalistas era que, nos debates mais relevantes, preparava sempre uma iniciativa que desencadeava a meio da tarde. Com isso pretendia chamar a atenção dos media e tentar que o assunto pudesse ser tratado pelos repórteres de televisão, de modo a assegurar a sua transmissão nos telejornais do ‘espaço nobre’.


Ainda no que se refere aos parlamentos, devido à cobertura informativa, há uma outra alteração de comportamento dos deputados que passa despercebida mas onde alguns são peritos. É ir «à boleia» do protagonista. Se um determinado deputado vai falar, se a sua intervenção está agendada e é considerada relevante, é frequente colegas de bancada sentarem-se ao lado. Conseguem-se vários objectivos. Primeiro, quem se senta ao lado tem a possibilidade de aparecer nas televisões e nas fotos da imprensa, ganhando assim visibilidade. Para alguns, estes segundos são os únicos momentos de «fama».
Por outro lado, consegue-se enfatizar uma imagem de importância porque o que está a ser dito é acompanhado com toda a atenção pelos colegas.

Por último, como os deputados vão dando sinais de concordância com gestos ou expressões orais, a intervenção ganha mais convicção.

 

(1). Spin Control

18
Fev11

2.4 Media que marcam a agenda

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Não é fácil conseguir a cobertura dos principais órgãos de comunicação social, nomeadamente das televisões. Apenas uma pequena parte dos acontecimentos agendados são relatados nos órgãos de comunicação social em geral e na TV em particular.
Há, no entanto, algumas técnicas que ajudam a conseguir o objectivo de «ser notícia».

Um dos processos é marcar a agenda dos média através de um ou dois órgãos de comunicação social. Por vezes é uma técnica eficaz porque nem os próprios jornalistas/editores se apercebem deste propósito.
O motivo é simples. É que os jornalistas, além de serem produtores de notícias, são também consumidores e deixam-se influenciar pelas manchetes de outros órgãos de comunicação social.
Um outro motivo, tem a ver com a preocupação dos editores em não deixarem de fora alguns temas importantes, que já estão a ser tratados nos outros media. O medo de serem ultrapassados e que provoca o mimetismo.
Para satisfazerem esta preocupação é até frequente seguirem a mesma abordagem e recorrerem a depoimentos das mesmas pessoas. Até o comentário dos mesmos especialistas.

Em Portugal, no final da década de 90, os órgãos de comunicação social diários e de informação geral, que mais determinavam as agendas das televisões, eram a TSF, o DN e o Público.
Num levantamento efectuado durante 20 dias, em Dezembro de 1997 (10 dias no decorrer da campanha eleitoral e os restantes 10, depois das eleições autárquicas), foi avaliado o impacto das notícias dos jornais diários.
A conclusão foi a seguinte: nove notícias do DN foram repescadas por outros órgãos de comunicação social. Essas nove notícias tiveram, no mínimo, 27 citações em outros órgãos de comunicação social, nomeadamente nos principais blocos informativos das televisões.
No mesmo período, o Público teve três notícias que foram citadas por outros media. Essas notícias tiveram, no mínimo, sete referências em outros órgãos de comunicação social, inclusive televisões. (1)
Refira-se ainda que, além da repescagem das notícias, em muitas outras situações, consegue-se influenciar o ponto de vista dos jornalistas de outros órgãos de comunicação social. Um exemplo: na primeira semana de Fevereiro de 1998 o Público colocou em primeira página um “Acordo global” entre o PS e o PSD sobre a realização de três referendos. Apesar de sucessivos desmentidos, esta informação foi um eixo permanente em vários media e, num caso, num directo da SIC, o jornalista chegou mesmo a falar num acordo global entre os dois partidos.

Se uma notícia tiver grande impacto e for salientada por um dos órgãos de comunicação social que marque a agenda dos outros media é possível que seja ampliada a sua repercussão.

É uma situação que pode interessar às várias partes. Cito o jornalista Luís Miguel Viana, numa referência que vem na página do Provedor dos Leitores, de Mário Mesquita, na edição do DN de 8 de Dezembro de 1997: “«Se um jornalista chegar hoje às redacções (…) e disser que teve acesso, em primeira mão, através do gabinete do ministro da Administração Interna, por exemplo, ao relatório de segurança interna (…), o seu texto terá acesso directo à primeira página (…). O que conta é que, com aquele exclusivo, o seu jornal conseguiu atingir vários objectivos que hoje são preciosos: ultrapassar a concorrência directa; reforçar os canais que permitem ter acesso a informação com origem no Governo; e induzir o noticiário de outros órgãos de informação que partilham a mesma cultura informativa, tais como as televisões e as rádios (deve dizer-se que, em Portugal, conseguir impor o tema do Fórum-TSF da manhã seguinte é um sinal, com muito prestígio, de que se alcançaram os objectivos pretendidos)”.

Nos dias mais recentes, há que ter em conta o surgimento de novos órgãos de comunicação, designadamente da SIC Notícias que é dos meios de comunicação social que mais condicionam os jornalistas. Devido à importância que atribui à informação, recorrendo com frequência a «directos» e ao facto de ter muitos noticiários ao longo do dia, acaba por ser uma «companhia» permanente em muitas redacções. O mesmo se passa em relação a páginas na web de alguns órgãos de comunicação social (caso do Público).

Mesmo que seja de forma empírica, muitos políticos percebem a «dinâmica» que as notícias produzem se forem publicadas em determinados órgãos de comunicação social. Em algumas situações é muito fácil. A quantidade de solicitações por telefone, a partir das Redacções, depois da difusão de uma notícia é um sinal claro do efeito de arrastamento junto dos outros media.

Este é um dos motivos porque alguns políticos têm um relacionamento privilegiado com determinados órgãos de comunicação social e reservam para eles os «exclusivos».

(1).
dia                Notícia                                                               referências*
3 DN - Jorge Coelho não participa na campanha        R. Nova; TSF, RC; SIC
4 Público - relatório europeu sobre prisões                RR;RC;TVI
5 DN - novidades na educação - bolsas                         RTP; RDP; R. Nova; RC
10 Público - obras no colégio moderno                        RC; SIC; TSF;
12 DN - sangue limpo nos hospitais                              TSF; RTP
16 DN - importado produto contaminado                   RTP; TVI RDP; TSF; RR; R. Nova
17 DN - lei incompatibilidades/autarcas                     RC
17 DN - bolsas a 50% estudantes pobres                      TSF
18 DN - artigo Pacheco Pereira                                     RR; TSF; Expresso
19 DN - recibos verdes na administração pública      RDP
22 Público - absolvido ex-secretário estado                TSF
23 DN - PS do norte conspira ao almoço                    TSF; RR; RC

18
Fev11

2.5 O exclusivo

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Os jornalistas têm duas «obsessões» não perder uma história que a concorrência pode dar e, se possível, ter uma «cacha». Um exclusivo.

Os políticos conhecem esta «obsessão» e conseguem tirar dividendos ao dar uma «cacha» a um jornalista. Além da relação positiva com o jornalista, quase sempre o órgão de comunicação social dá mais importância ao tema porque tenta valorizar o seu «exclusivo».

«algumas “cachas” que orgulham os seus autores são formas espertas de fazer passar a mensagem através do mensageiro certo, quer dizer, é propaganda sem propaganda» - Eduardo Cintra Torres; Público; 27/01/1998

Há quem se aproveite desta situação e, em vez de um, dá dois «exclusivos», uma «dobradinha». A história é dada a um jornal e à rádio ou uma televisão, com a garantia que tem embargo até às 0h/01h. Cada um deles até pode ter dados complementares, mas o sentido da informação veiculada aos jornalistas vai na mesma direcção.
Habitualmente, como são meios complementares, não há conflito de interesse entre os dois órgãos de comunicação social e o efeito que se pretende – a maior divulgação possível da mensagem e condicionar outros órgãos de comunicação social – pode ser mais facilmente atingido.

Referente aos assessores de imprensa e de comunicação do Governo de António Guterres: «Todos têm uma lista de órgãos de comunicação social que querem privilegiar. Nas televisões, os índices de audiência determinam a preferência. Quanto aos jornais, são os lidos pelos políticos, os de «referência»: Jornal de Notícias, Diário de Notícias e Público. Nas rádios, TSF, Rádio Renascença e Antena Um. Entre os semanários, pontifica o Expresso e não é apenas por ser o de maior tiragem». – Capital; 08/01/1999

Quando da escolha do órgão de comunicação social que vai ter o exclusivo, além dos critérios como a marcação da agenda, da credibilidade e da audiência coincidir com o eleitorado que se quer atingir, há, episodicamente, um outro factor - por vezes, um jornalista já andou atrás da história e até solicitou informações sobre essa matéria. Para evitar o sentimento de marginalização desse jornalista é habitual ser-lhe fornecida alguma informação, sem por em causa o exclusivo do outro órgão de comunicação social.

Há ainda uma outra situação que é mais grave e que nem sempre é evitada provocando, por vezes, grandes «estragos». Quando do contacto de um jornalista, para obter mais dados ou uma reacção, as assessorias ficam a saber o tema que ele está a trabalhar e alguns pormenores. Por vezes, há quem tenha a tentação de contar estes dados a outro meio de comunicação social. Quem fica “estragado” é o jornalista que estava a fazer a investigação e se apercebe que foi “traído”.

Definido o órgão de comunicação social a quem vai ser dado o exclusivo, a regra é respeitar o compromisso. Se não, o prejudicado é quem deu a informação. Fica com uma avaliação negativa e desprestigiada. É que, os jornalistas detestam sentirem-se enganados e, por outro lado, situações deste género, são sinais evidentes de má fé ou desorganização.

Um outro elemento que serve de regra quando se dá um «exclusivo» por exemplo, a antecipação de uma conferência de imprensa, é fornecer apenas uma parte da informação acerca da iniciativa. A razão principal é que não querem esvaziar o interesse da conferência de imprensa. Terá de haver algo de novo a dizer, se não mesmo o mais importante. Mesmo assim, muitos jornalistas ficam satisfeitos por terem antecipado parte da história.

Quando se antecipa uma iniciativa as assessorias fazem um acompanhamento permanente da informação, essencialmente nos meios rádio, tv e online. Em muitos casos, essencialmente quando surgem reacções de outras organizações, são mobilizados outros protagonistas para responderem e contra-atacarem.

Refira-se ainda que é também frequente dar um «exclusivo» sem surgir a «impressão digital» de quem foi a fonte de informação. Com alguma frequência alguns jornalistas que têm um relacionamento mais próximo com os agentes políticos recebem documentos, material comprometedor em relação a uma figura pública ou instituição.
Muitas vezes esta documentação está toda preparada para ser trabalhada e publicada. Ou seja, quem recolheu os dados já teve em conta a necessidade de ter elementos comprovativos. O jornalista que recebe estes dados, muitas vezes, limita-se a confrontar o visado da notícia. O resultado final parece uma «investigação jornalística» - o que lhe dá mais credibilidade - mas, na verdade, a recolha de informação foi feita por outras pessoas.