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Comunicação Política

Comunicação Política

12
Mai13

5. Uma mensagem credível

Um outro elemento fundamental em qualquer processo de comunicação é a credibilidade.
Se ninguém acredita no que está a ser dito, a mensagem não tem qualquer efeito.
A falta de credibilidade pode radicar no emissor, na argumentação que está a ser utilizada, no próprio tema que serve de base à intervenção política ou, na falta de coerência de todos estes factores.
Algumas das decisões políticas que parecem «forçadas» ou «artificiais» têm a ver com este problema de falta de credibilidade. A tentativa de aliança PSD/PP em 1998 é um desses exemplos. Depois das sucessivas acusações mútuas entre o PP e o PSD e entre Marcelo e Portas, poucos acreditavam num fácil entendimento entre os dois partidos. Com a agravante de que um dos atributos críticos do líder do PSD era a falta de credibilidade. Numa sondagem da Metris, efectuada em Julho de 1997, eram tantas as pessoas que atribuíam a Marcelo Rebelo de Sousa a característica de honestidade como a de não honestidade. Cerca de um ano depois, em 9 de Abril de 1998, uma outra sondagem da Metris publicada no Independente voltava a colocar a credibilidade como um dos pontos mais fracos da prestação de Marcelo Rebelo de Sousa. Em honestidade, Marcelo tinha 8,4% e Guterres 42,1%.

Foi devido a esta «falta de credibilidade» que no dia em que Marcelo Rebelo de Sousa apresentou as bases programáticas da AD (22 de Janeiro de 1999), Carlos Magno fez o seguinte comentário na TSF: “as propostas podem ser interessantes. Resta é saber se as pessoas acreditam no que Marcelo prometeu”. Este indicador de falta de credibilidade de Marcelo Rebelo de Sousa foi também utilizado pelo PS como um dos instrumentos de combate ao PSD: “O que Marcelo diz hoje, amanhã não é verdade; não se pode confiar no que ele diz; sobre a mesma matéria, em menos de um mês o líder do PSD já disse três coisas diferentes…”

O mesmo problema se colocou quando da formação da AD em 2002. A questão da credibilidade não estava propriamente nos protagonistas – Durão Barroso e Paulo Portas – mas na solução encontrada. No dia em que a coligação foi dada como certa, quase todos os órgãos de comunicação social publicaram desavenças antigas entre os dois partidos. Até alguns dirigentes do PSD, como Pacheco Pereira, salientaram as dificuldades porque «nesta coligação há uma profunda desconfiança, em grande parte devido a Paulo Portas».

O mesmo Pacheco Pereira, posteriormente, foi uma das vozes que se juntou ao coro que chamava a atenção para o comportamento «errático» de Santana Lopes, quando Jorge Sampaio fazia auscultações sobre a decisão de avançar ou não para eleições antecipadas. Nesta fase, em Julho de 2004, várias pessoas (como por exemplo Marcelo Rebelo de Sousa) apontavam a Santana Lopes um perfil inadequado para chefiar o Governo porque é ‘«hiperdecisório» e «pouco coordenado» e, como tal, tende a ter «decisões múltiplas ao longo do tempo. Não é um perfil que (…) seja porventura o mais indicado para primeiro-ministro» É desta forma que Marcelo Rebelo de Sousa define o novo líder do PSD.’ (TSFOnline, http://www.tsf.pt/online/portugal/interior.asp?id_artigo=TSF151938)

Quando a falta de credibilidade é um dos atributos dominantes, é muito difícil ultrapassar este problema.

Em alguns casos, a credibilidade só lentamente é adquirida.
Os responsáveis políticos fazem um rigoroso controlo da exposição pública e procuram evitar qualquer sinal de desconfiança.
Recorrem a personalidades com grande credibilidade e reputação para “mostrar” como estão a ganhar o estatuto de “figuras respeitadas”. Em outros casos, repetem até à exaustão os argumentos indutores de confiança: “«O espírito de solidariedade já existe hoje entre os dois partidos, os dois líderes, as duas direcções e estou convencido que entre os dois partidos na sua generalidade. Acredito plenamente que isto vai funcionar», disse Durão”. – Público de 29/03/02 sobre a assinatura do acordo entre PSD e PP.

Em outras situações a credibilidade só pode ser conquistada assumindo-se os erros. Próprios ou cometidos por pessoas da mesma organização politica.
Foi o que fez Ferro Rodrigues quando se candidatou pelo PS em 2002. Perante a ideia generalizada de que o governo e o PS tinham cometido vários erros, Ferro Rodrigues assumiu o que foi feito de negativo e prometeu que com ele seria diferente: «Também cometemos erros. É nossa responsabilidade percebê-los e tirar as necessárias consequências, para corrigir caminhos e enfrentar as dificuldades com seriedade, com sentido de responsabilidade e sem indulgências connosco próprios» “RENOVAR A MAIORIA - O nosso compromisso com os portugueses” - Moção de Estratégia de Ferro Rodrigues para secretário geral do PS em 2002.

A credibilidade não é uma característica intrínseca a um indivíduo. É antes um processo contínuo, que se pode solidificar (mas nunca pode ser dado como irreversível) e, muitas vezes, é resultado de técnicas que criam essa aparência.

A mais recorrente é mostrar convicção no que se diz e ser consequente nas ilações: «Penso que, com inteira lucidez, devo reconhecer que, se nada fizesse e se olhasse para estas eleições e passasse por elas como porventura seria integralmente meu direito constitucional, continuando a exercer as funções de primeiro-ministro, o país cairia inevitavelmente num pântano político que minaria as relações de confiança entre governantes e governados, que são indispensáveis para que Portugal possa vencer os desafios que tem pela frente» (António Guterres em 16/12/01 ao anunciar a sua demissão de primeiro-ministro depois da derrota do PS nas eleições autárquicas).

Uma outra regra muito relevante para a afirmação da credibilidade é nunca violar os compromissos assumidos. Muito menos os que serviram de bandeira – “leia nos meus lábios” (George W. Bush sobre o aumento de impostos); “no jobs for the boys” (Guterres sobre a colocação de apoiantes em cargos públicos), “eu não fujo” (Durão Barroso nas eleições seguintes à demissão de António Guterres).

Quando um destes compromissos é desrespeitado, torna-se um poderoso instrumento de combate político a favor dos adversários.

É igualmente importante que se seja respeitado pelos que o rodeiam. Uma das imagens fortes de Cavaco Silva era o respeito que merecia de outros membros do governo e do PSD, o que contribuiu para solidificar a imagem de um líder forte.

O ritual desenvolvido por Cavaco Silva nas remodelações era um exemplo da afirmação dessa autoridade. Não remodelava sobre pressão da comunicação social e, quando o fazia, os visados eram demitidos sem «cerimónia».
José Sócrates foi elogiado por seguir a mesma postura. Remodelações de governo, negociações com parceiros e medidas impopulares foram sempre assumidas sem hesitação e sem receio da conflitualidade de interesses.
Ao contrário, na fase final da sua governação, a partir de 2000, a imagem de António Guterres foi afectada pelas divisões internas e pela afronta de alguns colegas de partido. A juntar a estas divisões, Guterres reforçou a sua imagem de hesitação e de falta de autoridade quando o Governo alterou as medidas sobre a interdição dos touros de morte Barrancos e o limite de álcool no sangue para os condutores de veículos.

Outro atributo a que se recorre com frequência para reforçar a credibilidade é o recurso a especialistas e a citações de estudos. Foi de certa forma o que se passou no dossier da co-incineração no governo de António Guterres. Como havia um problema de credibilidade – as pessoas não acreditavam nos argumentos do governo – recorreu-se a uma comissão de especialistas que serviu de juiz na selecção das cimenteiras onde se iria realizar a co-incineração. Através deste instrumento pretendia-se restabelecer a confiança das populações.

Um outro exemplo teve lugar nas legislativas de 2002. Muitas das medidas apresentadas pelo PSD tiveram o apoio de várias personalidades ligadas aos respectivos sectores: “Numa sala cheia de autoridades do PSD, o líder Durão Barroso apresentou ontem no Porto o programa económico reafirmando a intenção de fazer o choque fiscal que permitirá incrementar a produtividade e a competitividade da economia portuguesa.” Público 15/02/02. A presença destas personalidades era um sinal de credibilidade.

Para fortalecer a imagem de credibilidade um outro elemento importante é ter resposta fácil e directa para as questões que vão ser colocadas e evitar cair em contradição. Em momentos políticos importantes os dirigentes políticos são treinados para estas situações e os assessores preparam respostas que permitam atingir esse objectivo. O mesmo se passa em relação à comunicação não verbal.
Como a classe política vive permanentemente com o problema da falta de credibilidade, recorre quase diariamente a frases e situações que pretendem anular a desconfiança dos eleitores: a actividade que se desempenha não tem outro fim que não seja o bem comum (”Mais importante do que qualquer partido é Portugal. (…) Portugal pode contar comigo” - Durão Barroso em 15/03/02); uma visão fria e a realista (”O caminho que vos proponho não é um caminho fácil. Mas há um caminho” - Durão Barroso em 13/03/02); não se quer influenciar as ideias e os comportamentos dos outros (”Quando convidei o dr. Fernando Negrão, não lhe perguntei se era de esquerda ou de direita” - Durão Barroso em 01/03/02) .
Mais, em algumas situações, até se pode estar a ser prejudicado pessoalmente – a actividade profissional que desempenhava dava mais rendimentos e menos chatices; tem provas dadas na actividade profissional e não precisa da política para conseguir seja o que for; o estatuto de figura pública só provoca constrangimentos, já teve convites aliciantes mas continua empenhado no cargo – foi o caso de António Guterres quando foi «sondado» para Presidente da Comissão Europeia: os dirigentes do PS não se cansaram de repetir que o primeiro-ministro preferiu permanecer no cargo.

No que se refere à argumentação, os problemas mais frequentes que podem por em causa a credibilidade têm a ver com contradições. Contradições relativamente a posições assumidas no passado; contradições entre o prometido e o que está a ser feito; e contradições com os valores dominantes.
A citação de posições assumidas pelo adversário no passado e que não correspondem às actuais é um dos recursos mais frequentes em política e é sempre de esperar na prática jornalística.
Em todos os partidos há gabinetes de imprensa que recolhem e arquivam informação para que, a qualquer momento, esse material possa ser usado no combate político.

No que se refere a posições que colidem com os valores dominantes de uma determinada audiência, há quem utilize a seguinte estratégia: não iniciar a intervenção com argumentos radicais, mas antes criticar com moderação esses axiomas e, lentamente ir chamando a atenção para as diferenças de pontos de vista.
Por exemplo, no referendo sobre o aborto era frequente os vários intervenientes (contra e a favor da despenalização) iniciarem as intervenções com as palavras «este é um problema complexo»; «a decisão é muito íntima»; «do ponto de vista ético não é fácil…». Tentavam começar de uma forma abrangente, com um argumento consensual, o que permitia uma melhor receptividade por parte da audiência.

«Quando a comunicação se faz num pequeno círculo, dados pessoais tornam-se mais relevantes para acentuar ou reduzir a credibilidade do emissor da mensagem. Torna-se importante, então, a naturalidade, a identificação do líder com o meio. (…) Porque são pessoas reunidas em um pequeno círculo, têm alguma coisa em comum. Então, antes de falar, o comunicador deve ouvir. Ouvir e descobrir este traço comum. Quais as aspirações, os problemas. Ambientado, conhecendo o seu palco, o comunicador será mais eficiente. (…) Terá naturalidade e saberá transmitir a sua mensagem no código adequado» - Eduardo Portella Netto

12
Mai13

6.Uma mensagem simples

Como a comunicação política se dirige a uma audiência muito vasta, a mensagem é simples, concisa e perceptível por todos.
Este não é o tipo de comunicação onde são feitas análises profundas.

Uma preocupação constante do prof. Cavaco Silva era que o seu discurso fosse facilmente assimilado pelos portugueses. Para ele era fundamental que as pessoas identificassem os objectivos da sua governação. Por isso, era o mais simples e directo possível. Procurava sempre converter em palavras correntes o jargão habitual das questões complexas.” - Fernando Lima (1)

Há excepções mas a grande maioria dos dirigentes políticos aprenderam que é essencial saber qual o público que vão atingir. É um dos trabalhos das assessorias. Fazer um levantamento de qual a audiência de um programa de televisão ou rádio. Qual a audiência de uma publicação. É tendo em conta esta aprendizagem que os principais responsáveis políticos sabem que uma mensagem para o “grande público” não é a mesma coisa que para um público especializado. Se uma medida for revelada no noticiário das 20h de uma das televisões, o discurso é o mais simples possível, mesmo correndo o risco de ser simplista. Se, por outro lado, a medida é divulgada numa revista da especialidade, já produzem um discurso mais técnico, mais elaborado e com pormenores.

Há também várias figuras de estilo a que os políticos recorrem com frequência para conseguirem uma mensagem simples e directa. Uma das figuras mais utilizadas é a metáfora.

cartaz de apoio a candidatura de Ramalho Eanes Se for bem utilizada, a metáfora ganha um sentido que vai muito para além das palavras. Foi o caso do apoio do PPD à candidatura de Ramalho Eanes à Presidência da República em 1976.

A audiência percepciona de uma forma mais precisa a mensagem que se transmite. Se for eficiente, não é preciso dizer mais nada. Está lá todo o sentido que se pretende dar.
Tem ainda uma outra vantagem: é facilmente mediatizada porque a metáfora é do agrado do discurso dos media. Um exemplo: a cobertura noticiosa da campanha do PSD no referendo da regionalização. No Domingo, 1 de Novembro de 1998, o DN dava o seguinte título à reportagem sobre as iniciativas de Marcelo Rebelo de Sousa: “Piquenicão «laranja» na Beira de Guterres”. No dia seguinte “Portugueses não são cobaias”. Na terça-feira, o lead da reportagem era: “Na cartilha do PSD, a regionalização - «um tiro no escuro, um cheque em branco» - tem muitos males”. Na quarta-feira o título era: “Uma bomba atómica no sistema partidário”.

Muitas vezes estas frases são fruto da imaginação do emissor. Mas nem sempre. Por vezes são resultado do trabalho de assessorias. Procuram uma expressão que tenha força, imaginação, simples e curta. Ou seja, funciona como um sound bite. Este é o «ponto forte de Paulo Portas, a capacidade de sintetizar rapidamente frases mediáticas para determinadas coisas e parecer sério», nas palavras de Einhart da Paz, que assessorou Durão Barroso e Santana Lopes. (2)

Os jornalistas gostam deste efeito porque têm o trabalho facilitado: é só pegar no que é emitido pela boca do político e colocá-lo no precioso segundo televisivo, ou no imaginativo jogo de palavras do título de jornal. É um estilo que se presta à frase assassina, à boutade, ao jogo de palavras” – Pacheco Pereira. (3)

Em alguns casos são os próprios jornalistas que alteram o sentido da expressão e transformam-na num sound bite.

Há outros processos simples e eficazes e do gosto dos jornalistas. Se a medida que vai ser anunciada implica um investimento significativo, este é um dado que os políticos dão grande relevo nos discursos e na pasta de imprensa que é entregue aos jornalistas.
O mesmo se passa com o número de pessoas abrangidas, que estão envolvidas na operação, a contabilização do sucesso alcançado….
Os jornalistas gostam muito deste género de números e com muita frequência dão-lhes largo destaque. Por vezes até anulam o efeito pretendido pelo emissor.

Quando do primeiro governo de António Guterres uma das medidas foi construir 12 novos centros de atendimento a toxicodependentes. Foi este o título da notícia na quase totalidade dos jornais, rádios e televisões quando do anúncio da medida. Mas, nas iniciativas seguintes, porque este dado constava no dossier de imprensa, era quase sempre o elemento relevante das notícias mesmo quando o acontecimento incidia numa outra questão. A partir daqui, em iniciativas sem grande impacte, referia-se este número e, em muitos casos, o elemento central das notícias era, mais uma vez, os 12 centros de atendimento.
Outro exemplo, mas prejudicial para a política de comunicação do governo de Guterres: quando a oposição (essencialmente o PCP) queria destacar a violação da promessa do «no job for the boys», referia o número total de nomeações realizadas. Por mais que o governo tentasse justificar e negar a acusação, raramente conseguia esse objectivo. O número era «fatal».

 

(1) No mesmo texto é referido um outro exemplo pelo jornalista Carlos Magno: “Interessa menos saber quem escrevia os discursos de Cavaco do que perceber porque é que ele fazia discursos assim. Simples e directos. Muitas vezes irritantes para as elites, mas eficazes no eleitorado que ele pretendia atingir. E com quem estabelecia cumplicidades. Ao discursar em Vila Real, depois de o seu governo minoritário ter caído na AR, Cavaco perguntou: «Se estávamos a governar bem, porque é que nos derrubaram?» Uma senhora da primeira fila do comício sugeriu: «Foi por inveja, senhor Professor». Cavaco, que até então tinha repetido a mesma pergunta em todo o lado, chegou ao comício da Régua e incorporou a resposta da militante anónima no seu discurso dizendo: «Só por inveja nos podem ter derrubado…»”.
(2) Independente; 22/03/2002
(3) Pacheco Pereira em Diário de Notícias, 1 Abril de 1999.

10
Mai13

Comentário

O comentário é cada vez mais frequente nos media portugueses e assume uma importância significativa.(1)


Por outro lado, o peso do tema de Política Nacional é significativo.

Num estudo publicado em Janeiro de 2008 "O Comentário Político e a Política do Comentário", Rita Figueiras concluiu que 42 por cento dos trabalhos publicados eram sobre política nacional. Em segundo lugar, com 10 por cento surgiam comentários sobre política internacional. Este estudo incidiu sobre Opinião publicada entre 2000 e 2005 no Expresso, Público, Diário de Notícias e Visão.

 

A opinião, o comentário tem uma forte capacidade de influência.

Por um lado, é uma mensagem fortemente persuasiva porque assenta numa imagem de imparcialidade. Por outro lado, é frequente o comentário ser feito por especialistas nessa área, o que reforça a credibilidade.

Segundo Benjamin Page, em Who Deliberates, «investigações mostram que a opinião destes especialistas transmitido nos media tem um impacte significativo na opinião pública. Os especialistas são apresentados nos media pelas suas credenciais (…) mas a sua escolha tem ainda a ver com a disponibilidade para participarem assiduamente, a capacidade de comunicação e de produção de sound bite». (2)

 

O sociólogo Villaverde Cabral, em declarações ao Público de 10/10/2004, admite que, directamente é reduzida a influência eleitoral dos comentadores, mas têm, um papel importante na determinação da agenda e «de forma geral, embora tecnicamente discreta, na orientação da opinião pública».

 

Deve-se ainda ter em conta que o comentário consegue atingir uma audiência significativa. Na forma do «comentador», do «editorial», do «mais e menos da semana» ou do texto de opinião.

Por exemplo, quando Marcelo Rebelo de Sousa fazia comentários no domingo à noite na TVI, o «Jornal Nacional» tinha em média mais de um milhão e meio de telespectadores e um «share» superior a 30 por cento. «A evolução do número de espectadores vai habitualmente crescendo até ao final do programa quando o professor fala» (Diário Económico de 07/10/2004) e «o Jornal Nacional de domingo tem-se posicionado nos três primeiros lugares do ‘top’ de programas mais vistos, normalmente acima das posições dos dias de semana» - Público de 07/10/2004.

Segundo o Expreso de 4 de Outubro de 2008, após a passagem de Marcelo Rebelo de Sousa para a RTP, "em 2005, segundo a Marktest, o professor estreou-se na RTP com um share de 38,4 e a média do 1º ano foi de 25,5. Este ano, o share médio está nos 21,6 e já é mordido pela concorrência. As últimas Notas Soltas de (António) Vitorino registaram 24,5 e Marcelo ficou-se pelos 21,5".

Em 2013, com o regresso de Marcelo à TVI a audiência rondava os 1,6 milhões de telespectadores. Quase à mesma hora, na RTP1, José Sócrates oscilava entre os 750 e 970 mil espectadores.
Segundo reportagem do Público, em 12 de Maio de 2013, Marcelo liderava na TVI acima de 1.4 milhões de telespectadores, seguia-se Marques Mendes na SIC com perto de um milhão e Morais Sarmento e José Sócrates por volta de 600 mil telespectadores.

 

Rita Figueira fez uma tese sobre «Os ‘opinion makers’ na Imprensa de Referência Portuguesa» e verificou que a partir da segunda metade da década de 90 aumentou significativamente a visibilidade dos comentadores. Na primeira página dos jornais começou a ser habitual a chamada para artigos de opinião. Alguns destes artigos são também colocados em páginas de destaque, como é o caso da última página.
O trabalho incidiu sobre seis jornais e um outro dado revelado é que nos anos 80 há 209 comentadores, 33 por cento são académicos, 22 por cento são políticos e 42 por cento são jornalistas. Na década seguinte o número de comentadores aumentou para 321 e a maioria são políticos (42 por cento), seguidos de 22 por cento de jornalistas.


Na reportagem atrás citada, do Público,em Maio de 2013, as tlevisões generalistas e temáticas de informação tinham 69 horas de comentário por semana. "Dos 97 comentadores com presença semanal na televisão portuguesa, destes, 60 são ou já foram políticos".


Segundo Felisbela Lopes a "carência de especialistas" é colmatada pelo "excesso de opinião composta pela classe política e pela classe jornalística"

Marcelo na TVI

No estudo da Marktest Media Monitor em 2002 sobre o conteúdo dos noticiários televisivos é apontado o valor global dos comentários de Marcelo Rebelo de Sousa e Miguel Sousa Tavares na TVI. Este último teve um tempo de emissão de mais de 12 horas ao longo do ano e Marcelo Rebelo de Sousa teve quase 23 horas.
Segundo o mesmo estudo, a presença do antigo líder do PSD na televisão e a notoriedade que conseguiu atingir, fez de Marcelo Rebelo de Sousa uma das personalidades com maior visibilidade na Televisão. Em 2002, estava em quinto lugar, depois de Durão Barroso, Paulo Portas, Ferro Rodrigues e Santana Lopes.
Marcelo Rebelo de Sousa até superava o Presidente da República.

 

Marcelo Rebelo de Sousa, Pacheco Pereira e Miguel Sousa Tavares são talvez os melhores exemplos do que Brian MacNair chama os jornalistas ‘pundit’ que estão a ganhar peso crescente na comunicação social. «Pundit é um termo que data do século XIX e que ainda sobrevive na Índia e refere-se a uma pessoa culta ou a um professor que não é apenas uma autoridade mas uma figura política reconhecida. (…) O ‘jornalista-pundit’ é alguém que o leitor de um jornal reconhece como uma autoridade em assuntos políticos. Ele transforma-se numa fonte que forma opinião, marca a agenda e a evolução de determinados temas. (…) Para alcançar este estatuto, o ‘pundit’ tem de ser aceite pela classe política, onde se move, obtém informação e estabelece julgamentos.» - Introduction to Political Communication; Brian McNair; Routledge; Londres; segunda edição, 1999

 

É ainda de assinalar que os comentários se transformam muitas vezes em notícias em outros órgãos de comunicação social. A criação de «factos políticos», com alguma frequência, provoca mesmo reacções oficiais de organizações políticas.

«O grupo parlamentar do PS contesta esta segunda-feira, em comunicado, as afirmações de Marcelo Rebelo de Sousa na TVI sobre a indicação do nome de João Pedroso para o Conselho Superior de Magistratura (CSM), numa altura em que, segundo o professor, o PS e o seu porta-voz, Paulo Pedroso, já sabiam estar sob investigação da Polícia Judiciária no âmbito do processo da Casa Pia». Diário Digital

Noutros casos, as reacções não são oficiais mas atingem uma dimensão muito relevante. Foi o caso da queixa de Jorge Sampaio de que não tinha tanto tempo de antena como Marcelo Rebelo de Sousa. Outro caso, mais controverso, foram as palavras do ministro dos assuntos parlamentares em Outubro de 2004. Rui Gomes da Silva acusou Marcelo Rebelo de Sousa de transmitir «sistematicamente um conjunto de mentiras com desfaçatez e sem qualquer vergonha». Estas declarações e a saída de Marcelo da TVI provocaram uma tempestade política, com fortes prejuízos para o governo de Santana Lopes.

 

Um comentário na TV, um editorial ou um artigo de opinião chegam a atingir um impacte que muitas organizações políticas não conseguem. Por mais iniciativas que desencadeiem.

Muitas vezes, porque dominam a linguagem dos média e sabem com exactidão o público a que se dirigem, há comentadores que fazem um trabalho notável de desconstrução. Conseguem com uma clareza ímpar explicar determinados acontecimentos ou comportamentos de actores políticos o que lhes permite uma excelente capacidade de comunicação.

 

Foi aliás notório, quando da saída de Marcelo Rebelo de Sousa o elogio feito à capacidade de comunicação do então comentador da TVI. É ainda de sublinhar que o comentário de Marcelo provoca uma leitura diferenciada. Varia consoante o background político de cada receptor. Nos fóruns realizados pela TSF e Antena 1 no dia seguinte à saída de Marcelo Rebelo de Sousa, os políticos e comentadores políticos sublinhavam a forma como ele exercia a influência política, através dos «recados» que mandavam. Por sua vez, ouvintes que revelavam não fazer um acompanhamento permanente da actividade política, preferiam sublinhar o papel didáctico desempenhado por Marcelo Rebelo de Sousa: a forma como explicava o que se passava, o enquadramento que dava aos temas para que todos percebessem e as críticas que fazia (que eram interpretadas como zeladoras do interesse comum).

 

Esta força e a linguagem irónica ou mordaz de alguns comentadores são factores que contribuem para a criação de antipatias e inimizades.

Este tipo de reacção é frequente em muitos políticos. Uns, (erradamente) acabam por comentar os comentários. Outros políticos, são também irónicos ou recorrem à hipocrisia porque sabem que é prejudicial uma reacção negativa. Preferem desvalorizar o desagrado que sentem e salientam a «obra feita» que já realizaram, a resolução dos problemas e dão a entender que não se deixam afectar pelas palavras críticas de um comentador. Não querem dispersar as energias e entrar em mais uma frente de desgaste. Sabem que o alvo das afirmações deve ser o adversário político e não alguém que está na margem desta luta política.

 

É igualmente reconhecido que, apesar da influência dos comentadores e da forma como fazem os comentários, assumindo-se como juízes do tribunal da opinião publicada, nem sempre o que dizem corresponde ao sentimento maioritário. A opinião dos comentadores e dos jornalistas, em geral, é mais o espelho da opinião das elites do que «a voz» do eleitorado. De certa forma, o prórpio Marcelo Rebelo de Sousa o reconhece quando afirmou ao JPN, em 2013, que "a influência dos comentadores é muito inferior àquilo que eles pensam. E a sua multiplicação banaliza essa influência, reduzindo-a, em inúmeros casos, quase a nula"
Segundo Einhart da Paz, antes das legislativas de 2002, «a imagem que Durão Barroso tinha na comunicação social – de não ser firme - não era a mesma que tinha entre o povo. Nem o formador de opinião, nem a elite comanda o voto. Nesse caso, a maioria silenciosa é que vale» (2). Como António Guterres disse a Bill Clinton, «nem sempre a opinião pública corresponde à opinião publicada».

 

A opinião transmitida pelos media é acompanhada pelos gabinetes de imprensa e muitos políticos preferem a leitura destes artigos às próprias notícias. Em alguns casos existe um espírito de abertura para reconhecer que alguns argumentos são válidos. Mas quando o comentário é negativo, muitos políticos têm uma reacção hostil colocando em causa a imparcialidade e a competência do comentador.

 

Curiosamente, a regra é ao longo do tempo crescer um sentimento de indiferença. Para os líderes políticos a única opinião válida é a da ‘corte’. O que constitui um problema porque «quanto mais alto você chegar, mais as pessoas à sua volta vão dizer o que você quer ouvir. Você terá sorte se um dos seus assessores lhe disser a verdade. A verdade vai doer». (3)

Nas estruturas mais profissionalizadas e com alguns recursos, a avaliação da opinião pública não se esgota na opinião publicada nos media. Realizam com frequência sondagens para avaliar se a acção política que estão a desenvolver tem uma apreciação positiva por parte do eleitorado.
«Morais Sarmento admite reactivar a estrutura que, no tempo de António Guterres, fazia estudos de opinião regulares sobre preferências detalhadas do eleitorado, por áreas temáticas, faixas etárias ou avaliações globais do Governo. Desactivada desde a saída de Guterres, esta estrutura de sondagens nunca foi utilizada pela equipa de Durão Barroso, que sempre disse recusar-se a governar sob pressão da opinião pública, mas que agora sente a necessidade de estar mais atenta aos sinais do eleitorado». Expresso 08/11/2003.

O mesmo se passa em momentos políticos de extrema relevância. Por exemplo, depois de um debate importante, são inúmeros e diversos os comentários produzidos. No entanto, avaliação é feita através de sondagens. E se os estudos são positivos, é feita uma fuga de informação para alguns jornalistas. O propósito é divulgar os resultados que mais interessam, de forma a atenuar algumas opiniões negativas feitas por comentadores políticos.

 

Muitos políticos procuram «amaciar» os comentadores que têm uma influência mais relevante. Como o próprio Marcelo Rebelo de Sousa afirmou em alguns comentários ministros e responsáveis da Administração Pública telefonam-lhe a tentar explicar o que se passou sobre um determinado assunto que já foi abordado ou que está a causar grande polémica.

 

Esta é uma das formas de evitar comentários negativos ou interpretações erradas.

Através deste diálogo é possível dar «background», explicar os condicionalismos das iniciativas e as opções que são feitas. Estes contactos por vezes não são convincentes, mas podem ser clarificadores em alguns aspectos e evitar erros e antipatias permanentes.

 

Cada político destacado tem a sua forma e um jeito particular de abordar estes comentadores. No entanto, para quem ocupa o cargo de primeiro-ministro parece ter sido institucionalizada a figura do pequeno-almoço. Foi assim com Cavaco Silva, António Guterres, Durão Barroso e José Sócrates que, com alguma frequência convidam directores dos principais órgãos de comunicação social e alguns comentadores para encontros informais.

 

 

(1) Para os órgãos de comunicação social também começa a ter importância a existência destes espaços de opinião - «Marcelo Rebelo de Sousa vai iniciar, já neste domingo, uma colaboração regular na TVI, regressando ao comentário político e à análise dos principais acontecimentos da semana. Marcelo tinha convites da SIC e SIC-Notícias, da RTP, da TSF e da futura televisão regional do Norte, além da Rádio Renascença» Expresso; 13/05/2000
(2) Público, 22/03/2002
(3) Poder e influência; Robert L. Dilenschneider; editora Record; RioJaneiro; 1994

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