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Comunicação Política

Comunicação Política

12
Mai13

Introdução

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Política é comunicação.
Toda e qualquer acção política passa pela comunicação.

Construir um movimento doutrinário, edificar uma estrutura assente em bases ideológicas ou pragmáticas, alargar essa estrutura gerando simpatias, crenças, expectativas…governar e fazer oposição. Tudo isto passa pela comunicação. “Para chegar ao poder, assim como para o exercer ou prestar contas ao cidadão, a política é comunicação.” (1)

Seja qual for o sistema político e a organização do Estado. A própria legitimação do sistema assenta nesta capacidade de comunicação - «as acções para gerar e manter a crença social da validade das instituições são em grande medida uma tarefa que se dá à propaganda. Nela se atribui a função de difundir os princípios e os valores que fundamentam o exercício ideológico, consolidar a legitimação do sistema.» (2)


Esta é uma das características mais salientes da Democracia porque está directamente relacionada com um dos elementos essenciais do sistema: o voto. Votar é escolher. Para haver uma escolha tem de existir informação sobre as candidaturas.

Quanto mais informação, quanto melhor o conhecimento acerca da governação, dos programas eleitorais e do estado do país, mais se afirma a Democracia. Apesar de, aparentemente, provocar resultados contraditórios: em Portugal, por exemplo, o grupo de pessoas com maior nível de instrução é o mais crítico e o que mais rapidamente assume uma postura de desconfiança em relação à governação do país.
Segundo o sociólogo Pedro Magalhães, a capacidade de discernimento deste tipo de eleitor perante o não cumprimento das promessas por parte do eleito propicia este sentimento negativo.

Os assuntos relativos a uma comunidade local ou a toda a sociedade deixaram de ser exclusivo de uma elite. Passaram para a «esfera pública» onde cada cidadão pode exercer os seus direitos, individualmente ou inserido numa organização.
O próprio debate dos temas colectivos é aberto e tende a ser o mais abrangente possível. Uma multiplicidade de direitos (e novos direitos) – cidadania, organização, opinião, diferença…. – são indutores da necessidade de afirmação, de fazer valer os respectivos pontos de vista para influenciar a tomada de decisão.
Este processo passa necessariamente pela troca de informação, pela procura de se ser notícia, de fazer parte da agenda dos media. Todos os suportes são válidos - imprensa, rádio, televisão, internet, comunicação directa ou por líderes de opinião....Esta necessidade não se resume às organizações políticas. Hoje em dia a estruturação do poder passa por outras entidades, como sindicatos e grupos de pressão. É um fluxo que se estabelece em rede, onde os núcleos centrais são os eleitos, os eleitores e grupos de pressão.

Independentemente destes efeitos, há uma necessidade permanente de os regimes democráticos serem sistemas abertos, com um fluxo significativo de informação.

O trabalho desses profissionais é, em síntese, recolher e interpretar informação e comunicar da forma mais positiva possível as decisões que são tomadas.

O objectivo principal passa por dois planos:
- dar a conhecer, de forma positiva, a organização e/ou a liderança;
- influenciar o cidadão em determinado sentido.

A primeira fase, «dar a conhecer», tem em vista a notoriedade: é a difusão do nome do líder, do candidato, da plataforma política ou das acções que estão a ser desenvolvidas por entidades, como por exemplo, governos, autarquias e partidos políticos.
Trata-se essencialmente de construir uma imagem, uma mais-valia em função dos outros concorrentes ou das propostas que estão em discussão.

“Fizemos uma sondagem que revelou isso mesmo, há uma percentagem assustadora de portugueses que não sabem quem é o Dr. Durão Barroso” (…) Por isso, o primeiro “outdoor” de campanha que o PSD vai pôr na rua tem a cara do líder e a pergunta “Já tem o Portugal que quer?”, sem qualquer menção ao partido, apenas o símbolo gráfico. “o que queremos, nesta fase, é dizer que ele é o líder, apenas isto” (3)
A segunda fase visa alcançar o apoio dos cidadãos. O objectivo é convencer – o verbo diz tudo - através da persuasão, de uma mensagem fortemente apelativa e frequentemente emocional. “É um processo comunicativo cuja finalidade ou objectivo é a influência. Uma mensagem persuasiva comporta-se segundo a conduta expressa pelo emissor para que seja adoptada voluntariamente pelo receptor”(4).

Se a comunicação política não atinge a audiência desejada, a mensagem que se pretendeu transmitir não tem qualquer relevância e, por vezes, até tem um efeito negativo. O mesmo se pode afirmar quando atinge a audiência pretendida mas a mensagem não é adequada.

Um outro elemento a ter em conta é que nem sempre o aumento da notoriedade implica uma melhor popularidade. No exemplo atrás citado, do outdoor e a volta a Portugal de Durão Barroso, o resultado não foi o melhor para o então líder do PSD. Segundo sondagens divulgadas pelo DN/TSF/Marktest (30-07-99), Semanário/Eurotest (30-07-99) e Expresso/Euroexpansão (31-07-99), com o final da volta a Portugal, Durão Barroso aumentou a notoriedade mas prejudicou a popularidade, devido essencialmente ao aumento de opiniões negativas.

Quer numa, quer noutra fase - que se podem e devem integrar – são definidos os objectivos a alcançar, o eleitorado preferencial a atingir, qual o tempo necessário para concretizar as iniciativas, a estratégia a seguir e as melhores formas para desenvolver essa estratégia.

Em todas estas fases há sempre um princípio a seguir: a comunicação é lançada por antecipação, antes que seja por arrastamento. Por outras palavras, a própria organização política não perde tempo na definição e desenvolvimento da sua imagem. Se não for assim, os adversários encarregam-se de construir essa imagem e, seguramente, não será muito boa.

Também pode ser a comunicação social a estabelecer essa imagem, privando, logo de início, a organização de controlar os mecanismos de produção dessa mesma imagens.

Um exemplo de antecipação que teve um efeito positivo para o autor da iniciativa: dias antes de tomar posse como ministro, Morais Sarmento deu uma entrevista num canal de TV onde confessou ter um passado toxicodependente. O facto de ter feito esta revelação, sem estar sujeito a qualquer pressão, permitiu-lhe receber rasgados elogios e inibiu os políticos adversários de insinuar este problema.

«Nuno Morais Sarmento mostrou muita coragem e personalidade na entrevista que concedeu a Maria João Avillez na SIC Notícias, ao revelar que já foi dependente de drogas duras e ao contar o seu difícil processo de recuperação e os apoios que teve.(…) Nuno Morais Sarmento vai ter tempo para mostrar se será ou não um bom ministro. Para já, mostrou carácter. E a coragem que a muitos falta.» Duarte Moral, DN; 13 de Novembro de 2002.

Por outro lado, esta antecipação evitou a possibilidade de o caso surgir, mais tarde, na forma de manchete de um jornal, apresentado como um grande escândalo.
«Para evitar uma das principais fontes de bons boatos, os estudiosos recomendam que você não inicie a campanha sem eliminar o background noise, isto é, o “ruído de fundo” na sua vida passada. Se você tem algo na sua trajectória que pode ser utilizado como munição pelos seus adversários, a melhor maneira de desarmá-los é contar logo. Assim, a “terrível denúncia” que eles iam fazer não existe mais.» (5)

Agora, um exemplo de sentido contrário. Dos efeitos negativos devido a um processo de comunicação que falhou por ser tardio na transmissão da mensagem principal: a campanha do “SIM” à regionalização no referendo realizado em 1998. «Ninguém explicou convenientemente os benefícios que a regionalização traria. Quando se tentou esclarecer a população já era tarde e já havia muito ruído por parte de outros partidos» - Margarida Ruas dos Santos in Diário Económico de 10/11/1998.

Um outo dado relevante é que, por melhor que seja a política de comunicação, ela não resolve tudo.
Santana LopesNas legislativas de 2005, Einhart da Paz foi o responsável pela campanha de Santana Lopes que teve um resultado eleitoral negativo: “«a campanha não surtiu efeito mas não foi errada», conclui Einhart, que se recusa a atirar as culpas para Santana (…) lembrando que «o papel do ‘marketing’ não é preponderante». Subjacente parece estar a certeza de que este era, à partida, um caso perdido”. – Expresso 26/02/05.

Elihu Katz, investigador norte-americano e antigo responsável da televisão pública de Israel, vai mesmo mais longe e assegura que «a realidade tem demonstrado que os milhões de dólares gastos em campanhas políticas têm conquistado um número desproporcionadamente escasso de votos. (6)

Uma política de comunicação ajuda, contribui, é um elemento vital, mas não é o único. «Sempre manifestei alguma desconfiança em relação às técnicas de “marketing” e a determinados “estilos de comunicação” que reduzem os discursos políticos a meros “slogans” para saírem nos telejornais e serem assimilados por grandes audiências. O essencial, para um dirigente político, é ter ideias próprias, objectivos claros e convicções sólidas. (…) Cito Abraham Lincoln: “É possível enganar toda a gente durante algum tempo, e mesmo alguma gente durante todo o tempo, mas não é possível enganar toda a gente durante todo o tempo”. É por isso que uma boa estratégia de comunicação se deve adaptar ao pensamento daquele ou daqueles que serve.» - Mário Soares no Prefácio de «As Presidências Abertas de Mário Soares». (7)
Com este pensamento, Mário Soares teria ficado “estupefacto” ao ler o Público de 5 de Julho de 1999, onde Manuel Maltez, o responsável da campanha do PSD, afirmou: «Sou um profissional remunerado que tenho agora como objectivo vender um partido político e vou vendê-lo como venderia um champô ou sabonete». A frase foi citada em vários jornais e por alguns políticos como sinal de exagero. Da parte dos dirigentes do PSD houve um profundo silêncio.

No lado oposto a este tipo de campanha, há o exemplo de João Soares.
Convencido que a «obra» realizada era suficiente para convencer o eleitorado em Lisboa, João Soares não quis recorrer a uma comunicação forte, a instrumentos de marketing, nas eleições autárquicas de Lisboa em 2001. Perdeu para Santana Lopes e uma das conclusões que assumiu é que a derrota foi, em parte, «por culpa própria. Aprendi que não é suficiente o trabalho feito. É preciso comunicar e dar a conhecer o projecto que defendemos», disse a Judite de Sousa numa entrevista na RTP em Julho de 2004.

O mesmo problema se tem colocado a vários governos. É frequente a referência à necessidade de haver uma comunicação eficaz com os cidadãos. Por vezes, esta dificuldade de comunicação é colocada como um dos principais problemas da governação.

Foi o que sucedeu com o executivo liderado por Durão Barroso.
Vários comentadores chamaram a atenção para a ausência de uma política de comunicação. ‘Para Marcelo Rebelo de Sousa o «Governo prepara medidas, vai tomando iniciativas, mas não tira proveito delas’. Pelo contrário, critica, «às vezes ficam grandes equívocos no ar». –DN; 10/12/2003. Nesta mesma edição o editorial do DN foi dedicado a este tema e o título era: «Comunicar é preciso», onde se explicava que «na capacidade comunicacional de um Governo repousa muito do seu trabalho político, porque o que hoje conta, verdadeiramente, são as mensagens que se passam à opinião pública».


Ciente deste problema e alertado pelas críticas, o então primeiro-ministro assumiu a necessidade de comunicação como um dos problemas da governação e, segundo conta o DN, fez dele um dos temas de um Conselho de Ministros: ‘«Precisamos de melhorar o nosso diálogo com os portugueses», apelou o chefe do Executivo.
Nessa mesma reunião, Durão pediu aos seus ministros que enumerassem as prioridades sectoriais de cada pasta para 2004. Na sua opinião, isto permitirá simultaneamente melhorar a comunicação interna e dar visibilidade externa ao Executivo no seu todo’.

A preocupação do então primeiro-ministro foi mais longe porque, a partir daqui, o governo começou a avaliar a hipótese de criar uma estrutura que coordenasse a comunicação do executivo. Esta proposta mereceu forte contestação, embora seja um processo perfeitamente normal em alguns países, como é exemplo os EUA.

Pelo que se pode perceber nos exemplos citados, há as mais variadas opiniões sobre o papel do marketing e da comunicação na política. O que parece ser unânime é que a política não pode dispensar estas técnicas de comunicação.
Até a contra gosto: «O PCP “embora não concorde com muitas das evoluções da vida política, inevitavelmente é condicionado por elas (…) Uma dessas evoluções é a personalização da campanha em torno do líder, que se tornou um pouco inevitável, nos últimos anos, pois é atrás dele que vão as televisões»” – Vítor Dias ao Público de 5 de Julho de 1999, sobre a preparação das eleições legislativas onde a CDU apresentou pela primeira vez outdoors com o rosto do líder do PCP.

Por outro lado, a capacidade de comunicação dos dirigentes políticos começa a ser um atributo determinante para as funções para as quais são eleitos ou nomeados, designadamente a liderança de uma organização política. «Tony Blair tornou-se o primeiro político britânico a assumir a liderança de um partido, porque na visão da maioria dos militantes, tinha uma grande capacidade de comunicação na televisão (…) Um dos motivos mais evocados no apoio a Blair era a crença de que era o melhor colocado para levar o Labour ao poder, devido à sua capacidade de comunicação com o eleitorado através dos media ». (8)
O mesmo disseram muitos comentadores políticos em relação à eleição de José Sócrates para líder do PS em 2004. Aliás, um dos argumentos utilizados foi a boa prestação televisiva do dirigente do PS nos debates na RTP contra Santana Lopes.

 

(1) Michel Bongrand; O Marketing Político; Publicações Europa-América;1986
(2) Mário Herreros Arconada; Teoria e técnica da Propaganda eleitoral; Coleccion Comunicación y relaciones públicas; PPU, Barcelona, 1989
(3) Público, 5 de Julho de 1999, citando declarações de Manuel Maltez, o responsável pelo marketing da campanha do PSD nas eleições legislativas de 1999.
(4) Alejandro Quintero.
(5) Sérgio Arapuã de Andrade; Como vencer eleições usando Tv e Rádio; Livraria Nobel; São Paulo; 1996
(6) Público; 23/03/1999
(7) Estrela Serrano, As Presidências Abertas de Mário Soares;
(8) Nicholas Jones; Soundbites & spin Doctors – how politicians manipulate the media – and vice versa; Indigo edition; Londres; 1996

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Mai13

1. Uma mensagem envolvente

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Vários estudos mostram que as emoções reforçam a eficácia da comunicação persuasiva. No estado de paixão, por mais explicações racionais que se procurem, há sempre uma razão que a razão desconhece.

Na comunicação política passa-se o mesmo. Os responsáveis de marketing político sabem que a persuasão mais eficaz é aquela que é mais agradável e mais envolvente.

Diz Roger Ailes, em “You are the message”, que o elemento mais importante da comunicação é «ser agradável. Dominando este elemento mágico, porque você agrada a uma audiência, perdoam-lhe quase tudo o que fez de mal. Se não lhes agrada, por muito boas que sejam as suas propostas, será irrelevante».

A mensagem com mais eficácia não implica raciocínios elaborados. “Na realidade, as mensagens propagandísticas de tipo racional tiveram e têm muito pouco êxito. Uma aproximação aos sentimentos das audiências, completada ou não por uma mensagem racionalmente elaborada, foi e é o único caminho da propaganda” - Alejandro Quintero (1)

 Para se conseguir este efeito opta-se, preferencialmente, por apelar à crença e às emoções.  
 O destinatário da mensagem não se sente coagido. É o que John Kenneth Galbraith chama “o poder condicionado”: não é visível, consiste na persuasão e na crença, “naquilo que o indivíduo, no contexto social, foi levado a acreditar e que se torne, para ele, intrinsecamente correcto.
 A aceitação social do poder condicionado aumenta tanto mais quanto se caminha do condicionamento explícito para o implícito”. (2)

Se um indivíduo estiver cativado através das emoções, das sensações, do interesse que a mensagem transmite, coloca menos filtros e é mais receptivo. Não só se sente envolvido, como coloca menos resistências à mensagem que lhe é transmitida. Além do mais, cria um laço de “fidelidade”: é mais difícil alterar uma opinião criada por emoções, por uma crença, do que uma opinião racionalizada.

Neste sentido, os políticos – à semelhança da mensagem publicitária - quando pretendem transmitir uma mensagem, tentam evitar a sensação de que estão ali para tentar convencer alguém - a “vender banha da cobra”.

Ao contrário, procuram dar a impressão de que estão ali para uma missão que, em geral, é de «defesa do bem comum».

De certa forma, esta é também a regra da própria comunicação social.
Um jornal, um noticiário, não é elaborado para convencer os receptores da veracidade e da importância das notícias – não está lá escrito: «isto é verdade». Para o jornalista e para o consumidor, a apresentação de determinado acontecimento num formato «informativo» é o suficiente para ser “verdade”. A objectividade não passa de um preconceito.

No entanto, o produto informativo, ele próprio tido como «objectivo», é, cada vez mais, produzido com técnicas para despertar o interesse do receptor e «agarrar» as audiências. Uma das técnicas mais recorrentes é a dramatização, que «nada mais é do que o esforço de tornar uma narrativa mais interessante, comovente, com vida, dando assim importância ao seu teor». (…) Um telejornal é um produto de uma emissora. Para atrair público/consumidor precisa cada vez mais, devido à crescente concorrência, de apresentar conteúdos diferenciadores através de formas diferenciadas. Ou seja, o seu material humano, quanto mais humano for lato sensu, mais personalidade agregará ao produto. Notícia por notícia, os computadores podem fornecer via Internet. Notícia com interpretação e vivacidade faz a diferença.» - Ivonete Pinto (3)

Por outro lado, este tipo de mensagem atinge audiências maiores porque vai ao encontro da preferência da maioria dos telespectadores. «Segundo um estudo sobre as motivações das pessoas quando vêem ou escutam um telejornal, a grande maioria deseja estar bem, passar bem o tempo. Estar informado é apenas um pretexto ou uma razão secundária para sentar-se em frente do televisor.» (4)

No início da década de 80 um responsável da RTP, Cesário Borga, afirmava que os directores de programas encaravam os telejornais com grande preocupação porque provocavam uma quebra de audiência no “prime time”.

Hoje o jornalismo televisivo evoluiu de tal forma que os telejornais são dos programas com maior audiência.

A razão é simples. O próprio modelo da informação adaptou-se a uma linguagem mais próxima do jogo da sedução e das emoções. Nem sempre a notícia de abertura de um telejornal é sobre um facto que tem grandes consequências no dia-a-dia do telespectador. A maior parte das vezes satisfaz apenas a curiosidade mórbida sobre situações muito particulares como um crime, um acidente, uma desavença familiar. Para o editor de um jornal televisivo, um facto não é valorizado pelas consequências que pode ter na sociedade.

O que é importante num acontecimento é que ele possa ter os ingredientes necessários para dar o que na gíria jornalística se chama uma “boa história” – ou seja, apelativa para as audiências. Nas palavras do investigador Thomas Patterson, «as notícias estão a perder a sua identidade e a parecer-se cada vez mais com produtos comerciais». (5). Citando um antigo director da BBC, Mark Levy, «um espaço informativo em televisão não é mais do que um passatempo, como outro qualquer».

De todos os meios de comunicação social, a televisão é a que mais recorre a este discurso envolvente. A principal janela para o mundo, que molda a “realidade” de muitas pessoas, vive das emoções e dos sentimentos – numa reportagem de um minuto nada se pode explicar, tudo se resume a uma impressão. Esta é uma comunicação que não provoca um distanciamento, uma postura activa e crítica de quem recebe a mensagem. Pelo contrário, provoca a passividade do receptor.

Passivo e dependente das imagens que a televisão lhe dá a conhecer, o telespectador acaba por dar maior credibilidade a essas imagens e orientar os seus pensamentos e comportamentos de acordo com a visão do mundo que lhe é transmitida.

Se muitos dos produtos informativos tiveram de recorrer a estas técnicas para se afirmar num meio profundamente competitivo, o mesmo fizeram as organizações políticas. Mais ainda, porque parte significativa da comunicação política é efectuada através dos meios de comunicação social. Saber dominar estas técnicas é um dado fundamental para conseguir fazer passar a mensagem.

Hoje é impensável a actividade política dispensar o recurso aos meios de comunicação social.
A classe política foi obrigada a adaptar-se à linguagem e à organização dos media.
Na verdade, muitos políticos aprenderam esta lição e não fizeram mais do que adaptar a sua comunicação a estes critérios editoriais.
Se a abertura de um telejornal obedece a um critério que selecciona um acontecimento porque tem os ingredientes necessários para cativar as audiências, os políticos começaram a «criar» esses acontecimentos tão do agrado dos jornalistas.

Por vezes, culpam-se os políticos de recorrer a esta estratégia de comunicação. Na verdade, lutam pela sobrevivência, limitam-se a seguir um critério «jornalístico».

Nas sociedades democráticas é o jornalista ou o produtor de um programa que define quem tem acesso ao palco. Fica ainda nas mãos do editor a capacidade de definir os conteúdos, de dar o livre-trânsito a uma mensagem, desde que o convidado respeite determinados requisitos. Ou a classe política aprende a utilizar o discurso que joga com a emoção, o espectáculo, o drama, a sedução, ou então … fica de fora do “quarto” do poder.

É frequente nas reuniões de planeamento de muitos órgãos de comunicação social ser discutido quem vai ser o entrevistado para um determinado programa. Alguns nomes são apresentados e, muitas vezes, são excluídos porque são pessoas «chatas». Ao contrário, quem dá bons títulos, usa frases-chave, provoca polémica…. quase sempre tem a porta aberta. E são, quase sempre, os mesmos.

O impacte deste tipo de comunicação na própria actividade política é a personalização. São retirados do debate os problemas estruturais, o confronto de grupos de pressão ou interesses abstractos. Muita da actividade política é descontextualizada e resume-se a um confronto entre personalidades.

Outro efeito é a permanente necessidade de construção de um discurso assente na dramatização. Devido ao tempo e espaço mediático, as organizações políticas têm de produzir um discurso vivo, com grande impacte nos consumidores dos mass media. Um tema ou uma abordagem, por mais relevante que seja, se não tiver a vivacidade exigida não tem uma existência «real», porque não passa nos meios de comunicação social.

Por último, outra consequência é a fragmentação das mensagens políticas. Porque o tempo mediático é reduzido, nunca há tempo para se contar uma “história”. A mensagem tem de ser parcial, tem de se escolher o fragmento mais adequado, a perspectiva mais útil…


 

(1) Alejandro Quintero
(2) Anatomia do Poder
(3) Ivonete Pinto; A dramatização no telejornalismo; Famecos/Puccrs
(4) Anthony Pratkanis, Elliot Aronson; La era de la propaganda – uso y abuso de la persuasión; Oaidós Comunicación; ; Barcelona; 1994
(5) DN; 22/04/1998